Folha de S. Paulo


Jovens sob pressão

O apelo do papa Francisco aos jovens na Jornada carioca --"manifestem-se"-- não pode ter resposta universal. Em regimes políticos fechados, manifestar-se não é exatamente uma opção. Além disso, a expectativa das sociedades em torno dos jovens difere muito.

Quem conversar com jovens chineses de classe média urbana, por exemplo, vai se dar conta de que o seu espectro de liberdade pessoal é limitado. Eles são alegres, mas frequentemente usam a palavra "yali" (pressão) para qualificar a vida.

A sociedade espera que, entre 22 e 28 anos, as pessoas assegurem um emprego estável, casem-se, tenham seu filho único e o deixem sob a responsabilidade dos avós.

Esse até pode ser o curso normal da vida em outros lugares. Na China, contudo, a cobrança para segui-lo é determinada.

Enquanto a economia crescia a dois dígitos, encontrar trabalho não era problema. Com o crescimento mais baixo, o cenário fica difícil. Em 2011, 17.5 % dos que se formaram ficaram desempregados. O número em 2013 deve ser bem maior.

Nesta semana, o premiê Li Keqiang encontrou-se com um grupo de graduandos e lhes sugeriu: criem oportunidades para si mesmos, inovem, abram negócios, tomem riscos. Em outras palavras, sua mensagem foi a seguinte: faremos o possível, mas vocês têm de se mexer.

É assim no país. A saúde é toda paga, não há universidade gratuita, as pessoas são responsáveis por si mesmas.

Para promover o casamento, os programas de "matchmaking" abundam, e as feiras matrimoniais são ativas, mesmo em cidades modernas como Xangai. Os pais levam cartazes em que descrevem as virtudes do filho ou filha, exibem fotos e entram em negociações diretas para marcar as ocasiões de conhecimento mútuo dos futuros noivos. Os interessados, em geral, não estão presentes, mas sabem que a trama os envolve.

Quem não frequenta feiras busca pretendentes no seu círculo e manda os filhos aos encontros. Quando não se produz o resultado esperado, parte-se para outra ou se diz ao pretendente cético: insista, no final dará certo.

Não ter filho pode significar render-se ao hedonismo, negar-se a enfrentar responsabilidades. Muitos jovens acreditam que até a sua chance de ascensão profissional fica prejudicada se o casamento não resultar rapidamente na paternidade. E moças casadas sem filhos reclamam de dificuldade para se empregar. As empresas preferem as que já são mães. Como o filho é um só, não há risco de licença-maternidade depois do nascimento.

Por que razão as tradições não mudam tão rapidamente quanto o país se moderniza? A explicação talvez esteja na última demanda aos jovens: incorporar ativamente os avós na educação dos netos.

Filhos criados pelos avós compõem uma sociedade de câmbios comportamentais lentos.

São necessárias duas gerações para que as práticas de conduta pessoal tenham pequenos avanços. E isso não se alterará tão cedo, até porque quase todos os que veem a idade chegando esperam ansiosamente a hora de atuar, pela primeira vez, como verdadeiros pais.


Endereço da página: