Folha de S. Paulo


Dunga, um retrocesso no ex-país do futebol

Tinha prometido a mim mesmo que não voltaria a falar de Copa do Mundo e de seleção, depois da saturação que se seguiu à goleada sofrida pelo Brasil diante da Alemanha. Mas a resposta da CBF ao fiasco, com a nomeação de Gilmar Rinaldi para coordenador e de Dunga para técnico, superou todas as expectativas.

O sentimento é de desânimo entre aqueles que em algum momento acreditaram na possibilidade de o revés de 2014 nos levar a um processo de revisão de conceitos em busca da reconciliação do futebol brasileiro com suas ambições perdidas.

É certo que a derrota na Copa gerou frustração e vergonha, mas não levou o país a uma depressão do tipo "vira-lata" –até porque a Copa foi evento, dentro do possível, bem-sucedido, que dirimiu as piores dúvidas sobre nossa capacidade de patrociná-la.

Em meio à incredulidade diante do resultado –de resto imprevisível– houve uma salutar reação reflexiva que chegou à óbvia conclusão de que o "aggiornamento" de nosso futebol seria o passo inevitável. Ficou no ar uma energia que, embora "negativa," parecia à espera do gesto capaz de reciclá-la como combustível para uma mudança de rumos.

Era o momento de a CBF transformar a decepção em apoio, escolhendo um supervisor acima de qualquer suspeita e um treinador com credenciais e experiência, mas que expressasse uma vontade de renovação. Mas seria esperar demais de gente como José Maria Marin e Marco Polo Del Nero. Venceu, mais uma vez, o garçom de costeletas e o sistema da Babilônia.

A questão não é saber se Dunga poderá ou não classificar a seleção para a próxima Copa –e até eventualmente vencê-la. O que estava em jogo era a perspectiva de inaugurar um novo ciclo no futebol do Brasil–ou, melhor dizendo, em nosso "pós-futebol", ou "ex-futebol," já que aquele parece relegado ao passado.

O que permaneceu, certamente, foi a herança de um arranjo político-administrativo na esfera futebolística totalmente anacrônico e defasado em relação ao próprio processo democrático e institucional do país.

A CBF não entendeu o que se passou e segue fazendo o possível para aprofundar o processo de descolamento entre seleção e torcedor –enquanto o futebol cada vez mais perde sentido como narrativa que se entrelaça com a "alma" –ou a cultura– brasileira.

Não deixa de ser sintomática, quanto a isso, a reação de pessoas nas redes sociais declarando-se, agora, à vontade para torcer por outras seleções.


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