Folha de S. Paulo


Geopolítica, países e empresas

Não é só o Brasil que vive momentos de grande tensão, com a política influenciando fortemente a economia e gerando incerteza, paralisia e volatilidade.

Apesar da percepção de que vivemos hoje em um mundo plano e interconectado, acessível a um toque no celular, as políticas e diferenças institucionais continuam exercendo papel central na organização dos negócios e na criação de expectativas.

Geopolítica nada mais é do que a influência da geografia sobre os processos políticos, os quais impactam a economia e os negócios. Refiro-me aqui não apenas à geografia física mas também às geografias humana, econômica, social etc.

Apesar da globalização, a geopolítica continua hoje tão ou mais ativa do que no passado. Exemplos de questões geopolíticas de grande impacto na atualidade são os atentados de Paris e Bruxelas e a corrente migratória em direção à Europa, o conflito Rússia-Ucrânia, as disputas no entorno da China (mar do Sul da China, Coreias, Japão, Taiwan), o risco Trump nos EUA e tantos outros.

Pesquisa da McKinsey com grandes executivos do mundo corporativo mostra que a instabilidade geopolítica aparece em primeiro entre os cinco maiores riscos que afetam o crescimento econômico. Riscos políticos e regulatórios impactam fortemente os negócios, principalmente quando as empresas operam em diferentes ambientes institucionais.

Tenho notado que empresas gastam muito tempo e energia tentando organizar seu ambiente e cultura interna, montando times que possam funcionar como orquestras bem afinadas. Mas, no geral, gastam pouco tempo tentando entender e atuar nas desarmonias externas. Além do ambiente interno, que costuma ser a prioridade, as empresas conhecem bem as cadeias produtivas, mercados e setores em que atuam.

Mas têm grande dificuldade para lidar com o ambiente externo, que em geral não funciona tão bem quanto o interno. Além disso, raras são as empresas que entendem o que está acontecendo em outras geografias do planeta, marcadas por políticas e ambientes institucionais completamente diversos daquele com o qual estão acostumadas. Muda a função objetivo da empresa, muda a atuação dos governos, muda a forma como as pessoas se relacionam, muda a velocidade da negociação e da tomada de decisão, mudam os valores e as culturas.

Por exemplo, quem sempre trabalhou em empresas tem dificuldade para entender a velocidade e o funcionamento dos governos, e vice-versa. Quando entram em cena diferentes geografias, culturas e ambientes institucionais, fica ainda mais difícil. E, quando a geopolítica influencia essa equação toda criando os seus caminhos e preferências, aí, sim, é que a coisa se complica de vez!

Por mais que a empresa esteja capacitada e afinada, as variáveis externas podem criar ou destruir muito valor para ela.

A crise aguda que o Brasil vive neste momento tem gerado desanimo e paralisia. Mas, como todo momento de crise é também um momento de oportunidade, deveríamos nos lembrar de que até aqui a nossa geografia mais ajuda do que atrapalha.

Nossas fronteiras são estáveis e bem definidas, não temos conflitos com nossos vizinhos, ocupamos o 5º lugar em área e população, falando apenas um idioma e sem grandes diferenças étnicas e religiosas.

Além disso, a combinação da ampla disponibilidade de recursos naturais com clima adequado, tecnologia e gente capacitada nos dá a oportunidade de trazer soluções concretas para questões que estão na base dos problemas geopolíticos da humanidade nas próximas décadas.


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