Folha de S. Paulo


Retrato fiel do Rio, 'Rappa Mundi' completa 20 anos

Marcus Desimoni/UOL
Santa Luzia, 02 de novembro de 2013 CIRCUITO BANCO DO BRASIL - SHOW O RAPPA A banda carioca o Rappa, liderada pelo vocalista Falcao, se apresenta no palco circuito durante festival musical realizado no Mega Space, região metropolitana de Belo Horizonte. Foto: MARCUS DESIMONI / UOL
Falcão, vocalista da banda O Rappa, durante show

RIO DE JANEIRO - Há 20 anos foi lançado um disco que traduziu como poucos o caos social do Rio de então: "O Rappa Mundi", da banda carioca capitaneada pelos Marcelos Yuka (principal compositor e baterista) e Falcão (vocalista).

Da abertura com "A Feira" — sobre o movimento de uma boca de drogas, na qual "vem maluco, vem madame, vem maurício, vem atriz" — até o encerramento com "Óia o Rapa" (sobre as famigeradas blitze contra os camelôs), são diversas as faixas que retratam com humor e sagacidade a metrópole em ebulição.

É um tanto desalentador ouvir o CD e perceber que ele reflete o Rio atual, que está retrocedendo ao pandemônio de duas décadas atrás. Os confrontos na Cidade de Deus no último sábado (19) são apenas mais um sintoma.

Após a operação policial na favela, que resultou na queda de um helicóptero da PM e na morte de seus quatro ocupantes, sete corpos de moradores foram encontrados com sinais de execução em uma mata. Traficantes, dizem os policiais.

"Tudo bem, ele era o bicho, mas saiu daqui inteiro e até chegar ao hospital ganhou três tiros no peito. E a galera daqui fez igual fizeram em Vigário Geral: todo mundo pra rua, aumentar o som, pra causar algum tipo de repercussão", diz a letra de "Tumulto".

Com a notícia de que uma juíza autorizou a polícia a fazer buscas e apreensões coletivas na favela —uma temeridade, para dizer o mínimo—, é sempre bom lembrar que "menos de 5% dos caras do local são dedicados a alguma atividade marginal" e que "a grande maioria daria um livro por dia, sobre arte, honestidade e sacrifício", como Falcão e seu xará D2 (outro grande cronista daqueles tempos) cantam na ótima versão para "Hey Joe".

Tomara que, assim como em 1996, estes tempos sombrios ao menos sirvam de inspiração para jovens atentos fazerem denúncia em forma de arte duradoura.


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