Folha de S. Paulo


A política vai aos shows, mas (quase) não sobe no palco

Reprodução/Facebook
Caetano Veloso - Fora, Temer
O músico Caetano Veloso exibe cartaz de protesto contra Michel Temer

RIO DE JANEIRO - Zé Ramalho, que comemorava 40 anos de carreira, ouviu. Os Novos Baianos, atualmente em turnê de reunião, também ouviram. Jorge Ben Jor, idem. A Nação Zumbi não só ouviu, como incentivou. Elza Soares, Karina Buhr e Johnny Hooker fizeram o mesmo.

Tornou-se praxe no Rio: onde há show, ecoa o grito de "fora, Temer", vindo do público. Assisti à cena inúmeras vezes, nas mais variadas circunstâncias e locais. Desde aqueles em que tal manifestação seria previsível —como no Circo Voador, histórico palco esquerdista da cidade, na boêmia Lapa— a casas mais elitistas e, teoricamente, menos propensas a esse protesto, como o Metropolitan, na Barra, e o Teatro Municipal, com ingressos de R$ 120 a R$ 1.200.

Os gritos nem sempre são unânimes -em alguns casos, ouviram-se tímidas vaias—, mas tornaram-se parte tão indissociável dos espetáculos quanto aquela saída de cena que precede o bis. As reações no palco variam: uma boa parte, notadamente os artistas mais velhos, ignora solenemente as manifestações da audiência.

Notável exceção foi Caetano Veloso, que, após se apresentar na abertura da Olimpíada, divulgou uma foto dos bastidores em que segurava um cartaz com a frase de protesto contra o presidente.

Ninguém é obrigado a se manifestar politicamente em público, menos ainda durante seu próprio show —e, não raro, para um público pagante que mistura pessoas com opiniões antagônicas. Não se trata, pois, de patrulhar artistas para que apoiem ou rejeitem um dos lados.

Mas não deixa de ser curioso que muitas das estrelas escolham ignorar milhares de pessoas bradando. Não me recordo de outro momento em que coisa semelhante tenha acontecido. De qualquer modo, num momento em que parecem não faltar piromaníacos, talvez essa neutralidade seja conveniente.


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