Folha de S. Paulo


Tenho uma profunda curiosidade sobre fotos antigas, de gente comum

Débora Gonzalles/Editoria de Arte/Folhapress
Débora Gonzalles de 09.julho.2017
Débora Gonzalles de 09.julho.2017

Tenho uma profunda curiosidade sobre fotos antigas, de gente comum, em momentos muito alegres.

Sei que é uma curiosidade bem específica. Quando vejo a alegria de outros tempos em outros rostos, sou tomado por uma imediata melancolia. É como se fosse uma evidência, uma prova viva da passagem do tempo, a nos avisar que nossa hora também vai chegar.

Em Los Angeles tem uma feira de antiguidades chamada Fairfax, na avenida de mesmo nome. A banca que mais me chama atenção é a que vende fotos antigas. São muitas caixas, a maioria dos anos 1970 e 80. Lembranças familiares, filmes revelados, sobras de álbuns jogados e misturados para quem quiser comprar.

Quem compra lembranças alheias? Não sei. Mas tenho especial fascinação por fotos de aniversário. São vários anônimos amigos na mesma imagem, celebrando a vida, felizes.

Alguém reuniu aquelas pessoas, comprou comidas, bebidas, eternizou o momento em uma máquina, revelou aquele filme, e hoje aquela alegria do passado está jogada, misturada a um passeio na praia de outra família, a um senhor lavando seu carro, a duas crianças a caminho da escola e um pôr do sol de algum lugar. Alegrias órfãs, que se perderam de seus donos. Onde vão parar as minhas memórias felizes quando eu não estiver aqui?

Uma vez vi numa revista uma foto do início do século 20. A imagem era impressionante pela quantidade de cabeças brilhantes que posavam após um almoço. Pereira Passos, então prefeito do Rio, reuniu um grupo que tinha Machado de Assis, Olavo Bilac, Joaquim Nabuco e Oswaldo Cruz, entre outros. Em comum nesses personagens, duas coisas: todos fizeram a diferença em suas áreas e todos já estão mortos.

Fiquei olhando a foto e pensando em como a vida é um sopro mesmo. Da felicidade do encontro de pessoas tão geniais, sobrou uma imagem. O tempo levou todo o resto. Não se sabe nem o motivo de estarem ali.

O Facebook fica revirando nossas caixas virtuais e nos lembrando do passado. Ali também somos confrontados com flashes de uma vida que já não temos, de amigos dos quais nos afastamos, de momentos que não voltam.

Outro dia recebi fotos das minhas filhas bem pequenas. Hoje elas têm oito anos. Fiquei olhando para aquelas crianças que já não existem, abraçadas a um pai que eu já não sou, e me deu uma saudade da gente...

Por que algo que serve pra eternizar uma alegria só consegue me lembrar que ela já passou?


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