Folha de S. Paulo


Um projeto para fazer alunos campeões

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Branquinha fica na região da mata alagoana, a 60 km de Maceió. Tem 13 mil habitantes e muitos problemas. No IDH do Censo 2010, ficou em 5.490º entre os 5.570 municípios brasileiros (96º entre 102 de Alagoas). Nesse mesmo ano, a enchente do rio Mundaú varreu a cidade do mapa: 90% dos prédios destruídos.

Ouvi falar do local por causa do Profmat (Mestrado Profissional em Matemática). É o maior mestrado do Brasil, formado por uma rede de mais de 70 universidades e institutos que atua em todos os Estados e é coordenada pela Sociedade Brasileira de Matemática. Seus alunos são majoritariamente professores de matemática na rede pública. Classificado com a nota máxima da Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior), já formou mais de 3.000 mestres desde 2011.

O Profmat também é um instrumento para conhecermos melhor a nossa educação, permitindo contato com realidades de todo o país. Aceitei com prazer o convite do professor Amauri Barros, da Universidade Federal de Alagoas, para participar da banca de mestrado do seu orientando, Cícero Rufino de Goes, da rede municipal de Branquinha.

Cícero é um desses professores que fazem a diferença: vêm à mente Antonio Amaral (Cocal dos Alves - PI), Claudiene dos Santos (Coité do Nóia - AL), Geraldo Amintas (Dores do Turvo - MG), Luiz Felipe Lins (Rio de Janeiro - RJ) e muitos outros. Frente a tantos teóricos da educação, que nem sequer entram em sala de aula, na sua dissertação ele nos brinda com um diagnóstico lúcido, em linguagem simples, com a legitimidade de quem sabe (e faz) o que diz.

O professor Cícero é um fã da Obmep (Olimpíada Brasileira de Matemática das Escolas Públicas). Afirma que "as olimpíadas de matemática vêm, ao longo dos anos, transformando a maneira de ensinar e aprender os conteúdos da referida área nas escolas públicas e particulares". Entre os benefícios da Obmep, destaca "melhorar a qualidade do ensino e aprendizagem de matemática, resgatar o interesse pelos estudos e a autoestima dos alunos e professores".

Os alunos de Branquinha participam na Obmep desde que ela foi criada pelo Impa em 2005. Até 2014 não haviam ganhado nem uma menção honrosa. Desinteresse de alunos, famílias, professores e escolas: "a simples pronúncia da sigla Obmep provocava de imediato um semblante de desmotivação e incredibilidade, fazer a competição havia se tornado um fardo", conta. "Existe um consenso comum entre a maioria deles de que a matemática, além de ruim, é chata".

Em 2015 tomou uma atitude: lançou "Desenvolvendo e aplicando a matemática: um projeto voltado para produzir vencedores na Obmep e elevar os indicadores sociais do município de Branquinha". Com o apoio da prefeitura, mobilizou as 14 escolas e todos os professores de matemática do município para oferecer capacitação aos professores e aos 1.800 alunos da rede. "Tinha-se que mudar essa triste realidade e a Obmep com sua dinâmica de envolvimento, suas belas histórias de sucesso, seus desafios e seus benefícios foi a ferramenta necessária e suficiente para tal feito", escreveu na dissertação.

Também criou a OBM (Olimpíada Branquinhense de Matemática), para alunos do 1º ao 9º ano. Segundo conta, "a realização da OBM provocou uma verdadeira revolução no ensino de matemática do município, as escolas queriam ser campeãs e começaram a preparar seus alunos". Acrescenta que "vários foram os relatos de pais e professores surpresos com a mudança de postura dos seus filhos e alunos frente a buscar por novos conhecimentos e um aprendizado significativo". Quando comentei que o Impa planeja estender a Obmep para os anos iniciais do ensino fundamental, respondeu com entusiasmo: "crianças dessas idades adoram estudar matemática"!

Os resultados estão aparecendo. Em 2015, os alunos de Branquinha ganharam suas duas primeiras menções honrosas na Obmep. Nesse ano o Ideb da cidade alcançou 4,8 nos anos iniciais (era 2,2 em 2005) e 3,6 nos anos finais (era 2,1 em 2005) do ensino fundamental, acima da maioria dos municípios alagoanos. E em 2016 foram duas medalhas de bronze e seis menções honrosas.

Mas o mestre Cícero sabe que as conquistas vão muito além das condecorações: "Atingiram o ego de toda a comunidade escolar, fizeram os pais acreditarem ainda mais nos seus filhos, os alunos terem mais estímulos para aprender e acreditarem ainda mais no seu potencial enquanto estudantes e acima de tudo levaram os professores a acreditar no seu potencial enquanto profissionais". E filosofa: "Independente das dificuldades sempre é possível se obter bons resultados quando se trabalha com foco e determinação".

Já pensou se essa moda pega?!


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