Folha de S. Paulo


Dieta frugívora, e não vida social, explicaria por que primatas evoluíram

Christopher Sessums/Flickr
Frutas

O leitor com certeza já topou com explicações para a inteligência dos primatas com base na hipótese do cérebro social. Por ela, a quantidade de massa cinzenta evoluiu de passo com a complexidade da vida social.

Um novo estudo, porém, vem colocar um grão de sal nessa teoria edulcorada. Alex DeCasien, Scott Williams e James Higham, da Universidade de Nova York, acreditam que a chave está na dieta.

Não resta dúvida de que uma pessoa (ou um macaco) com maior capacidade de observação e de processar informações se dará melhor navegando na teia de favores e intrigas que compõe as sociedades primatas. Humanos que o digam, com tanta fofoca entre eles, agora amplificada pelas redes sociais.

Embora aceita por muitos, a hipótese não contava com forte apoio quantitativo. DeCasien e colegas partiram para testá-la com medições numa amostra grande de espécies (142), o triplo da quantidade de macacos reunida nos maiores estudos até então publicados.

Eles levantaram e tabularam três tipos de dado: tamanho do cérebro, tamanho médio dos grupos –como indicador de complexidade social– e elemento dominante na dieta. Na análise estatística, verificaram que não há correlação entre o volume dos miolos e o número de integrantes do bando de animais.

Encontraram, por outro lado, uma forte associação entre alimentação baseada em frutas e cérebros maiores, na comparação direta com primatas que se nutrem principalmente de folhas. É o caso, entre outros, do cotejo entre macacos-aranha (frugívoros do gênero Ateles) e bugios (folífagos do gênero Alouatta).

Seriam duas as razões evolutivas para a dieta de frutas favorecer complexidade cerebral. Primeiro, como encontrar frutas é mais difícil que topar com folhas, os primatas que dependem delas precisam exigir mais da memória e da capacidade de discriminação e navegação.

Além disso, frutos superam folhas no aspecto nutritivo. Contêm mais energia, o que permite sustentar as necessidades de consumo nos cérebros maiores.

A pesquisa de DeCasien, publicada na "Nature Ecology and Evolution", dá uma boa balançada na hipótese dominante, mas não chega a deitá-la por terra. Como aponta na mesma revista Chris Venditti, da Universidade de Reading (Reino Unido), as medidas utilizadas estão sujeitas a certa controvérsia.

Tamanho do cérebro, para começar, talvez não seja um bom sucedâneo para medir inteligência. Seria preferível trabalhar com a parte do órgão mais diretamente associada com capacidades cognitivas, o córtex cerebral (fina camada externa de células nervosas, que nos humanos costuma ter de 2 mm a 4 mm), mas essas informações não são tão simples de reunir.

Outro defeito está em tomar o porte do grupo como indicador de complexidade social. Entre chimpanzés, objeta Venditti, bandos podem ter de 2 a 20 dezenas de animais.

Se a quantidade varia tanto numa única espécie, como extrair conclusões firmes da dispersão amostrada entre várias? Além disso, o tamanho do grupo não tem relação necessária com a quantidade de interações em seu interior.

Pode-se concluir, no entanto, que o engenhoso estudo de DeCasien já deu frutos: indica novos caminhos para continuar investigando as fontes evolutivas da inteligência.


Endereço da página: