Folha de S. Paulo


Dois Portugais de floresta perdida

Pense duas vezes antes de apontar o dedo para o Brasil (ou a Indonésia) se o assunto for países que mais desmatam no mundo. Rússia e Canadá ganham de nós, e os Estados Unidos estão à frente da Indonésia.

A área total de floresta perdida em 2013 foi 180 mil km2, o equivalente a dois Portugais. O dado resulta de cálculo a partir de imagens de satélite realizado pela coalizão Global Forest Watch, que reúne 60 organizações sob a coordenação do World Resources Institute (WRI, veja detalhes em bit.ly/1PM86nO).

Pela metodologia usada, considera-se destruída a área que perdeu mais de 70% do dossel das árvores. Não se faz distinção entre as causas da mortalidade, se derrubada ou fogo intencionais, incêndios naturais ou doenças.

As florestas que sofreram as perdas mais aceleradas foram as boreais, no topo norte do planeta. A terra de Vladimir Putin, por exemplo, viu desaparecerem 43,2 mil km2 ao ano de cobertura arbórea no período 2011-2013.

O território devastado na Rússia corresponde a uma área maior que a Suíça. No Canadá, foram 24,5 mil km2. No Alasca (EUA), 17,4 mil km2.

O Brasil aparece em terceiro lugar no ranking, com a média anual de 21,6 mil km2. A cifra não bate com o dado oficial do desmatamento na Amazônia Legal (5.012 km2 de corte raso em 2013-14), porque inclui todos os biomas, não só a floresta amazônica, e usa critérios diversos do que se considera devastação.

Na Indonésia perecem a cada ano 16 mil km2. Somadas todas as florestas tropicais, o total do ano de 2014 chega a 100 mil km2, território que se equipara ao da Coreia do Sul e representa mais da metade de tudo que se perdeu no planeta.

O padrão geográfico do desmatamento nos trópicos está mudando, no entanto. Brasil e Indonésia, tradicionalmente apontados como vilões, conseguiram obter reduções significativas nas taxas de desmatamento dos últimos anos.

A média brasileira na Amazônia, onde se faz o monitoramento mais minucioso com imagens de satélite (sistema Prodes), caiu de 20 mil km2 anuais para 5 mil km2, como resultado de uma política consistente de combate à devastação. O governo indonésio, de seu lado, estendeu a moratória de autorizações para novas derrubadas de matas para plantar dendê e produzir óleo de palma.

Outros países despontam agora com taxas crescentes de destruição. No Camboja, por exemplo, o incremento foi de 14,4%. Até o Uruguai (quarto lugar, com 8,1% de aumento) e o Paraguai (sexto, 7,7%) entraram na lista, ainda que possuam áreas pequenas de matas tropicais.

Com tudo isso, o planeta ainda conta com a cifra astronômica de mais de 3 trilhões de árvores, segundo estudo publicado na quinta-feira (3) no periódico científico "Nature". Desse total, algo como 1,4 trilhão está nas florestas tropicais e subtropicais, como as do Brasil, que ostenta cerca de 302 bilhões de indivíduos arbóreos.

Pense na enormidade disso: 1.500 árvores para cada brasileiro. É uma forma de riqueza. A média mundial fica em 400 por habitante.

O problema é que 15 bilhões de árvores são abatidas a cada ano no planeta, segundo estimativa dos autores do estudo na "Nature". Os terráqueos já devastaram quase metade das florestas que havia no globo quando começaram a andar sobre ele. Os brasileiros não precisam trilhar o mesmo caminho irracional.


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