Folha de S. Paulo


Janaina rebate argumentos dilmistas, e Cardozo diz que acusação é pretexto

Alan Marques/Folhapress
Julgamento tem discursos da acusação (Reale e Janaína Paschoal) e da defesa (Cardozo)- Sessão de julgamento do impeachment de Dilma, no plenário do Senado, em Brasília (DF)
Julgamento tem discursos da acusação (Reale e Janaína Paschoal) e da defesa (Cardozo)

Ouviu-se de tudo nas argumentações finais da acusação contra Dilma Rousseff, na sessão de terça (30) do Senado.

A advogada Janaina Paschoal atribuiu a Deus a tomada de consciência da população quanto à necessidade do impeachment. Chorou, dizendo pensar nos netos da presidente afastada. Afirmou, ademais, que o Senado é soberano para julgar Dilma, mesmo levando em conta circunstâncias e fatos não mencionados na denúncia.

Seu colega de tribuna, Miguel Reale Jr, concordava. Acrescentou que o Senado tem "estatura moral" para julgar Dilma Rousseff, e que o impeachment haverá de inaugurar uma nova época no país.

Época prenunciada, aliás, pelo sucesso de nossos atletas olímpicos, que triunfaram pela "labuta" e pela "persistência", e não pela "malandragem". Os senadores ouviram tudo em silêncio.

Houve argumentos técnicos também. Janaina Paschoal rebateu os argumentos dilmistas sobre as pedaladas fiscais e os decretos não autorizados. No primeiro caso, o das pedaladas, o que o governo fez não foi apenas atrasar os pagamentos que devia ao Banco do Brasil: tratava-se de verdadeira operação de crédito, de verdadeiro empréstimo, coisa vedada pela Lei de Responsabilidade Fiscal.

O PT, aliás, votou contra essa lei de Fernando Henrique, que evitava a prática de governos estaduais terminarem quebrando seus bancos por não pagar empréstimos. Pois bem, naquela época havia ao menos um contrato explícito regulando a transação; ficava claro o que acontecia.

Agora, prosseguiu Janaina Paschoal, a defesa de Dilma argumenta que os atrasos do governo não equivalem a um empréstimo, porque não existe contrato entre os bancos e a União. Ora, isso é pior ainda, concluiu a advogada: faz-se de modo oculto, fraudulento, aquilo que antes da Lei de Responsabilidade Fiscal pelo menos se admitia formalmente.

Também os decretos não autorizados constituíram, para a acusação, um logro. Os agentes econômicos foram levados "inocentemente" (palavras de Janaina Paschoal) a acreditar que o governo estava em condições de arcar com despesas extraordinárias. Mas nos mesmos dias em que os gastos eram autorizados o Planalto já sabia que suas metas de superavit teriam de baixar muitíssimo.

Meros pretextos, rebateu José Eduardo Cardozo, pela defesa. Os gastos extraordinários não aumentaram em "um níquel" o deficit do governo, porque foram feitos tirando verbas de outras rubricas. Decretos desse tipo se submetem, sempre, a uma norma anterior, a do contingenciamento de despesas. Ou seja, já estava estabelecido um teto máximo para as despesas, e os decretos extraordinários não o alteraram.

E mesmo que fossem gastos novos, será que estariam em desacordo com a meta anual de superavit, que acabava de ser alterada? Não, disse Cardozo, porque uma meta anual não tem necessariamente de ser cumprida em julho, quando os decretos foram editados.

É como se eu me comprometesse a emagrecer 12 quilos até o final do ano, disse o ex-ministro de Dilma. Ao fim do primeiro semestre, percebo que só emagreci três quilos. O que faço? Intensifico o meu regime dali para a frente, ou então converso com o médico e revejo minhas ambições. O governo fez novo acordo com o "médico", propondo ao Congresso nova meta orçamentária. Não há relação disso com os decretos de gastos, que não impuseram novas despesas.

Quanto aos atrasos no pagamento do Banco do Brasil, as chamadas pedaladas, Cardozo argumentou que todo contrato, formal ou verbal, pressupõe um acordo de vontades entre os contratantes. Mas não há "acordo de vontades" no plano de financiamento aos agricultores, que é estipulado em lei. Como dizer, aliás, que o governo "atrasava" seus pagamentos se em nenhum momento tinha sido estipulado o prazo para saldar a dívida?

As razões do impeachment foram modificadas e articuladas de forma retroativa, concluía Cardozo. Numa tentativa de frear a Lava Jato, sugeriu. Diante de tantos pretextos, não seria o caso de pelo menos ficar em dúvida quanto às acusações? E vamos esquecer o princípio de que, na dúvida, o réu deve ser inocentado?

No plenário, contudo, os senadores já não pareciam ter dúvida. O "conjunto da obra", inclusive no que diz respeito à irresponsabilidade fiscal antes das eleições, pesava mais do que os pontos da denúncia.


Endereço da página: