Folha de S. Paulo


Limites da violência

Embora Roberto Saviano, especialista em máfia e tráfico de drogas, tenha desistido de ir à Flip por questões de segurança, frequentadores notaram a presença mais ostensiva da polícia, na sexta-feira (3).

Não é preciso ser traficante ou autor de livros para se sentir, de algum modo, espionado nas ruas de Paraty. Os olhares que os passantes trocam parecem ter algo de inquisitivo –quem é você? Eu conheço?

A sensação de vigilância haverá de ter perseguido um pouco a portuguesa Alexandra Lucas Coelho, autora de "Vai Brasil".

Ao lado da argentina Beatriz Sarlo, que lança um livro sobre suas viagens à América Latina, ela contou, neste sábado (4), como viu a violência no Rio, onde morou de 2010 a 2014.

Nas favelas do Rio, a repórter do jornal português "Público" espantou-se ao encontrar armas que só tinha visto no Oriente Médio.

Tinha ido a um baile funk –e se divertiu com a variedade de linguagens que se registram nos bairros e comunidades cariocas.

Enquanto isso, o público se divertia com o sotaque da portuguesa ao falar do "burác quént" que há numa "ladáir" da "Mangáire".

Mas maior estranheza com nossa língua teve Sarlo, em sua viagem fluvial pelo Brasil na década de 1970.

Imbuída de desenvolvimentismo, entusiasmava-se com a construção de hidrelétricas. Repetia sílaba por sílaba, como um lema, sem entender, a palavra "U-ru-bu-pun-gá".

Era um nome, assim como o de Niemeyer: no Brasil, a jovem crítica literária buscava Brasília e a modernidade estética.

Alexandra Coelho, depois de dar a volta ao mundo, reencontrou-se no Brasil com o colonizador português. Este procurava o ouro –ela encontrou, disse, a magia e o milagre de um país sobrevivendo no limite da violência. E, quem sabe, da modernidade também.


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