Folha de S. Paulo


Uma outra leitura

A Folha publicou no domingo passado o resultado de uma pesquisa do Datafolha que mostra que 82% de seus assinantes na Grande São Paulo estão satisfeitos com a cobertura jornalística da crise política. A edição não destacou, no entanto, um dado que considero importantíssimo: praticamente a metade dos leitores ouvidos questiona a isenção do jornal.

Segundo a pesquisa, 55% acham a cobertura imparcial, contra 42% que a avaliam como parcial. Como a margem de erro da pesquisa (feita por telefone com 301 leitores) é de seis pontos percentuais para mais ou para menos, é possível que, no limite, os que apontam a falta de isenção cheguem a 48%, contra 49% que acham que o jornal é imparcial. Um empate, na prática.

O índice dos que consideram a cobertura parcial chega a 55% (variação, nos limites da margem de erro, de 49% e 61%) entre os leitores de 16 a 34 anos.
A pesquisa tem uma falha, na medida em que não aprofunda com os leitores o que identificam como parcialidade. Mas há pistas interessantes. Levados a comparar o ânimo crítico da Folha em relação aos governos federal, estadual e municipal, os leitores revelam que acham o jornal mais crítico em relação ao presidente Lula (PT) do que em relação ao governador Geraldo Alckmin (PSDB) e ao prefeito José Serra (PSDB).

A pergunta era se achavam a cobertura da Folha crítica na medida certa, mais crítica do que o necessário ou menos crítica do que o necessário. A maioria considerou que os três eram criticados na medida certa (70% no caso de Lula, 70%, de Alckmin, e 66%, de Serra). A diferença aparece nas duas outras opções. Enquanto 9% dos leitores acham que o jornal critica o governo Lula menos do que o necessário, 23% têm a mesma opinião quanto ao governo Alckmin e 25% quanto ao governo Serra. Ou seja, é maior o número de leitores que acham o jornal mais tolerante com os tucanos. Um detalhe importante: mais leitores declaram simpatia pelo PSDB (23%) do que pelo PT (14%).

A impressão de mais tolerância com os tucanos se confirma no item seguinte: 20% consideram que o jornal é mais crítico com Lula do que o necessário, contra 2% que têm essa avaliação em relação ao governo Alckmin e 4% em relação ao governo Serra.

Não são dados conclusivos, mas são indicações que devem fazer o jornal refletir. O fato de que quase a metade dos leitores considere a cobertura parcial obscurece as qualidades apontadas pela pesquisa, a saber: 78% destacam que a cobertura é completa (contra 18% que a têm como incompleta) e 82% a definem como séria (contra 15% que apontam sensacionalismo).

Venho cobrando da Folha, nesta e em outras coberturas, três aspectos que julgo os mais importantes para a credibilidade de um jornal: a qualidade (da informação apurada), o equilíbrio (na cobertura e na edição) e o pluralismo (nas análises e nas versões). São compromissos assumidos publicamente pela Folha no seu Projeto Editorial e no "Manual da Redação".

Não entendo, portanto, por que o jornal não chamou a atenção para o principal ponto negativo da pesquisa e não o tratou abertamente com os seus leitores. Ainda há tempo.


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