Folha de S. Paulo


Na boca da urna

Há dois aspectos da cobertura eleitoral dos jornais que não tratei, por falta de espaço, no balanço que fiz na coluna de domingo passado: o uso das pesquisas eleitorais e o acompanhamento da eleição para a Câmara de Vereadores.

Esta eleição foi marcada pela proliferação de novos institutos de pesquisas e pelo aumento do número de cidades pesquisadas. Foi um fenômeno percebido pelo jornalista Fernando Rodrigues em artigo na Folha ("As pesquisas", de 29/09) e pela revista "Veja" ("Você acredita nas pesquisas?", edição de 6/10).

Segundo levantamento de Rodrigues, nas eleições de 2000 foram feitas pesquisas em 120 cidades; neste ano, em 147. Ele calcula que agora cobriram cerca de 45% do eleitorado brasileiro.
Deve ter havido muita picaretagem, mas as regras do tribunal eleitoral vêm padronizando os procedimentos que permitem aos eleitores avaliarem a qualidade das pesquisas e a seriedade dos institutos e dos jornais.

A obrigação de publicar a data da pesquisa, o número de eleitores entrevistados, a margem de erro e o registro no TRE é respeitada hoje pelos jornais sérios. Mais pesquisas, mais informações, mais transparência nas eleições.

MENOS PESQUISAS
A Folha, no entanto, não acompanhou, neste ano, a expansão das pesquisas eleitorais. Ainda por conta da contenção de despesas que se impôs, o jornal, pioneiro no uso intensivo dessa ferramenta de aferição da intenção de voto desde a criação do Datafolha, em 1983, teve de reduzir drasticamente o número de cidades pesquisadas.

Segundo informações do próprio Datafolha, em 2000 foram acompanhadas as eleições municipais em 21 cidades (dez capitais, incluindo São Paulo, e 11 cidades paulistas); neste ano, em apenas duas, São Paulo e Fortaleza.

No primeiro turno de 2000, a Folha publicou 17 rodadas de pesquisas em São Paulo e nove nas demais cidades. Foram feitas boca-de-urna em todas. Neste ano, foram nove rodadas em São Paulo e cinco em Fortaleza.
É evidente que esse enxugamento empobreceu a cobertura nacional do jornal, que procurou compensá-lo usando, acertadamente, os resultados de outros institutos idôneos. Com isso, o leitor teve acesso a um leque grande de pesquisas que, em outras épocas, o jornal evitava publicar, ou publicava sem destaque, por ter seu próprio instituto.

A BOCA-DE-URNA
O grande problema provocado pelos cortes de pesquisas do Datafolha ocorreu no final da campanha paulistana. O instituto fez três levantamentos na reta final. No dia 24 de setembro, Marta Suplicy (PT) e José Serra (PSDB) estavam empatados em 35% das intenções de voto; no dia 29, seguiam empatados, com 34%; e na última pesquisa, feita dias 1º e 2 de outubro, sexta e sábado, continuavam em empate técnico, mas Serra tinha oscilado para 37% e Marta continuava com 34%. Traduzidos em votos válidos, equivalia a 40% para Serra e 37% para Marta, com margem de dois pontos percentuais de erro.

Por contenção de despesa, não foi feita a pesquisa de boca-de-urna. Como se sabe, o resultado oficial foi 43,53% para Serra e 35,85% para Marta. A diferença de quase oito pontos percentuais não foi captada por nenhum instituto.

A boca-de-urna não tem hoje a mesma importância que tinha quando a apuração era lentíssima e terminava um ou dois dias depois de abertas as urnas. O resultado da pesquisa era a principal informação dos jornais no dia seguinte ao da eleição. Mas continua importante para complementar as pesquisas de intenção de votos e para alimentar os noticiários de rádios, TVs e sites da internet antes da divulgação do resultado oficial.

Neste ano, em São Paulo, apenas o Ibope pesquisou na boca da urna, e constatou um empate de 40% (com uma margem de 1,7 ponto percentual de erro), que não se confirmou.

O SEGUNDO TURNO
No caso do Datafolha, não dá para dizer que tenha errado, porque sua última pesquisa é do dia 2. Mas não se pode afirmar também, como fez reportagem da Folha publicada dia 4, que o "Datafolha detecta onda de crescimento de Serra". Os dois vinham empatados e o Datafolha só poderia ter detectado e informado a respeito dessa "onda de crescimento" se tivesse feito a boca-de-urna, como admite o diretor do instituto, Mauro Paulino: "Não é correto, e considero injusto, imputar à pesquisa um erro que não foi dela. O erro foi não fazer boca-de-urna".

Em relação aos cortes nas pesquisas, reproduzo seus comentários, feitos a meu pedido: "Apesar das limitações, posso dizer que o Datafolha tem pautado o processo eleitoral em São Paulo desde dezembro do ano passado, quando já mostrava a viabilidade eleitoral de Serra. Acho que a diminuição de pesquisas prejudicou enormemente a cobertura eleitoral da Folha, pois os números exclusivos do Datafolha sempre foram um diferencial marcante em relação a outros veículos, e explicitavam a abrangência nacional da cobertura".

Vamos agora para o segundo turno das eleições. Pela importância do que está em jogo e pela disputa acirrada que se advinha, o ideal é que o Datafolha pesquise até a confirmação dos votos.


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