Folha de S. Paulo


Evasão fiscal de empresas impede tratamento de resíduos, diz dirigente

Não é dinheiro. Sonegação de impostos de grandes empresas, somada a corrupção, falta de transparência e falhas de governança são os principais entraves para a correta destinação dos resíduos no mundo. Como consequências, a poluição dos rios, mares e terrenos, a perda de recursos econômicos e os problemas de saúde, agravados, sempre, nas zonas de maior desigualdade e pobreza do globo.

Esse foi o mote do discurso de David Newman, presidente da ISWA (International Solid Waste Organisation), associação mundial que reúne as empresas de administração de limpeza pública, durante a segunda Assembleia da ONU (Organização das Nações Unidas) para o Meio Ambiente, em Nairóbi, no último dia 27 de maio.

Ele acusou grandes empresas de não contribuírem com programas de recuperação de resíduos, não pagarem impostos e guardarem seu dinheiro em paraísos fiscais. E conclamou o público a trabalhar para fechar as brechas fiscais e colocar o dinheiro para trabalhar a favor do planeta.

Segundo Newman, o tratamento adequado de resíduos sólidos padece dos mesmos males que os serviços públicos como o fornecimento de água e de esgoto. Os resíduos sólidos, para lembrar, são os resíduos não-orgânicos, os passíveis de reciclagem hoje em dia e os que podem vir a ser recicláveis com o avanço das pesquisas, em determinado local.

Muito dinheiro é necessário para levar os serviços públicos para os 30% do mundo sem sistemas de coleta e para assegurar a eliminação segura de 40% de todos os resíduos, bilhões de toneladas que são despejados no meio ambiente. Newman estimou que atualmente sejam necessários US $ 60 bilhões por ano para assegurar uma gestão dos resíduos em países em desenvolvimento com coleta e deposição adequada em aterros, em vez de lixões.

Mas esse dinheiro some. Segundo Newman, além da corrupção entre elites e funcionários governamentais que provoca perda de recursos, há uma grande evasão fiscal por parte de grandes empresas. Essas mesmas empresas lutam contra programas que responsabilizam os produtores para garantir a recuperação correta dos produtos por elas colocados nos mercados de consumo.

"Não só essas empresas colocam produtos de consumo em mercados onde não pagam impostos, mas também não pagam nada para recuperar ou reciclar esses produtos quando se tornam resíduos. Portanto, temos um retrato devastador da corrupção pelo mundo todo e elites governamentais permitindo que essas corporações escapem do seu dever de pagar impostos", afirmou.

Segundo ele, enquanto as economias desenvolvidas podem encontrar outras formas de renda, através de impostos sobre as vendas, roubo destes recursos financeiros de países em desenvolvimento os condena à pobreza.

"Estas mesmas empresas são escandalosamente hipócritas. Basta ler os sites da Apple, Starbucks, Microsoft, e você vai encontrar frases como "nosso planeta merece o nosso melhor pensamento" ou "pioneiro em Soluções Sustentáveis "ou " temos sido neutros em carbono desde 2012 e estamos comprometidos com práticas empresariais responsáveis", citou.

"Enquanto lutamos por cada centavo para assegurar serviços de gestão de resíduos nos países mais pobres, essas mesmas empresas estão lutando para garantir não contribuir com um centavo de seus lucros para quaisquer serviços nesses países", disse.

"A evasão fiscal é o equivalente de roubo massivo de recursos financeiros necessário para desenvolver infraestrutura de saúde pública, incluindo para os resíduos, por 40 por cento da população do mundo. A retenção desses fundos pode causar a morte de milhões nos países pobres a cada ano". Newman deu ironicamente parabéns às empresas Apple, Microsoft, Starbucks, General Electric e IBM.

"Devemos trabalhar em conjunto para obter esse dinheiro e colocá-lo para trabalhar onde ele é mais necessário, agora. O planeta não pode esperar", finalizou.


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