Folha de S. Paulo


Lixo: País não conseguiu erradicar os lixões no prazo; coleta avançou

O Brasil não conseguiu extinguir os lixões no primeiro prazo estabelecido pela Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), que vence no próximo domingo, 3 de agosto de 2014.

Segundo a última atualização de dados levantados pelo Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), na semana passada, 2.507 dos 5.564 municípios brasileiros ainda destinam o lixo coletado nos domicílios e aquele proveniente do sistema de limpeza pública a lixões (45%), que são áreas sem nenhum controle ambiental e a céu aberto; 815 municípios enviam para os chamados aterros controlados (14,6%) e 2.243 enviam para aterros sanitários (40,4%), que são os locais adequados.

Oito capitais destinam inadequadamente seus resíduos: Belém, Manaus, Macapá, Porto Velho, Campo Grande, São Luís, Aracaju e Brasília.

Junto dessa má notícia, uma boa. Nos dois últimos anos houve avanços na coleta seletiva. A avaliação é de Albino Rodriguez Alvares, que coordena as pesquisas de resíduos sólidos do Ipea. "Em 2010, de 15 a 20% dos municípios tinham algum tipo de plano de coleta. Hoje, são 50%", diz. "Não se deve desprezar o plano (PNRS) porque o prazo dos lixões não foi cumprido. O mais importante é seguir na redução dos resíduos e alavancar a reciclagem", analisa.

A PNRS determinou o caminho que os resíduos devem percorrer e as responsabilidades nessa cadeia. Os municípios devem parar de usar lixões como depósitos de resíduos. Devem enviar os resíduos coletados para aterros sanitários. E somente devem chegar aos aterros os rejeitos, que são a sobra da sobra, o que não é passível de reciclagem ou reaproveitamento. A regra é reaproveitar o máximo para que somente o mínimo seja descartado, ampliando o tempo de vida dos aterros sanitários.

Aterro sanitário é uma obra de engenharia complexa, com grandes áreas impermeabilizadas, sistemas de medição de gases e de escoamento de chorume. Aterro controlado, segundo alertam especialistas, é um lixão adaptado mas sem controles ambientais necessários para evitar a contaminação do solo com as substâncias tóxicas do lixo e de sua deterioração.

Sendo assim, somando lixões e aterros controlados, são 3.322 os municípios que descartam inadequadamente os resíduos, ou 59,6% das cidades do país.

A meta de acabar com os lixões em 4 anos, estabelecida pela lei de 2010, era considerada ousada demais por alguns e impossível de atingir por outros. Não foi surpresa deixar de atingi-la. A surpresa, para Albino Rodriguez Alvares, foi verificar que nos últimos seis anos não houve o que ele chama de "movimentação relevante" no processo de migração de lixões para aterros sanitários nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste.

"Já se sabia que a meta era difícil. Mas se esperava que a meta impulsionasse uma aceleração na direção da correta destinação dos resíduos. E o que se verifica, no entanto, é que essas regiões Norte, Nordeste e Centro Oeste ainda não começaram um movimento importante de fechamento dos lixões", diz.

Na contramão, portanto, do que se esperava, entre 2008 e 2014, o número de municípios que fazem a correta destinação, para aterros sanitários, na região Norte, caiu de 45 a 36. O número de cidades que destinam resíduos a aterros controlados subiu de 45 para 50, de 2008 a 2014. Atualmente, 80,9% dos municípios da região Norte usam lixões para destinar seus resíduos.

No Nordeste, de 2008 a 2014, o número de municípios que usam aterros sanitários subiu de 157 a 172, mas a região ainda está longe de resolver o problema: 1.509 municípios usam lixões. Só no estado da Bahia, 331 municípios têm o lixão como destino final dos resíduos urbanos.

O problema maior, segundo ele, está nos municípios pequenos. "Eles têm pouco orçamento e portanto mais dificuldades para conseguir fazer os aterros necessários", diz Alvarez. "Para ser viável, o aterro sanitário tem que ser grande, porque tem ganho de escala", diz.

Prefeitos organizados na Associação Brasileira de Municípios (ABM) e na Confederação Nacional dos Municípios (CNM) têm se mobilizado para prorrogar o prazo de adequação à PNRS. A CNM tenta aprovar emenda sugerida pelo deputado Manoel Júnior (PMDB-PB) que pede a prorrogação do prazo por mais oito anos, para que os governos municipais fechem os lixões e destinem os resíduos para aterros sanitários.

Depositar resíduos em lixões é considerado crime ambiental desde 1998. A diferença é que, com o fim do prazo estabelecido pela PNRS, os administradores municipais ficam sujeitos à ação do Ministério Público (MP).

O MP pode aplicar multa, com valores que dependem do impacto ambiental causado pelo lixão, da quantidade de resíduos e da proximidade de mananciais, por exemplo.

Podem também ser orientados Ajustes de Conduta, determinando prazos para que os municípios elaborem planos para erradicar os lixões.

Os municípios tiveram até 2012 para elaborar os seus Planos de Gestão Integrada de Resíduos, que deveriam contemplar coleta seletiva, redução da produção de resíduos e destinação final adequada.

Entre 2011 e 2012, tiveram linhas de verbas do Ministério do Meio Ambiente - aproximadamente R$ 56,7 milhões - para isso.

A PNRS não menciona a necessidade de entrega dos planos a um órgão específico para avaliação. Mas, quando o município ou estado for pleitear recursos destinados à gestão de resíduos sólidos a algum órgão do governo federal, como MMA, Ministério das Cidades, Funasa, Caixa Econômica Federal, Banco do Brasil ou BNDES, será necessário apresentar o seu plano, que será avaliado pelo respectivo órgão federal.

Para Alvarez, aumentar o prazo não resolve o problema. "O processo atual precisa ser revisto. É preciso que os municípios se unam para fazer os aterros e que recebam auxílio na governança intermunicipal e na gestão técnica dos aterros, com maquinário e pessoal", diz .

SÃO PAULO

A cidade de São Paulo não usa mais lixões para os resíduos e já publicou seu plano de gestão de resíduos. No Estado, segundo Zuleica Perez, coordenadora de Planejamento da Secretaria do Meio Ambiente (SMA), a determinação de acabar com os lixões foi cumprida, embora existam entre 27 e 29 deles "funcionando por conta de liminares na Justiça".

Zuleica diz que a Secretaria vem capacitando prefeituras dos municípios com oficinas sobre gestão. "O Plano Estadual de Resíduos Sólidos de São Paulo aponta para a regionalização, para agilizar licenciamentos ambientais e construção de aterros em consórcios intermunicipais", diz a coordenadora.

Uma versão preliminar do Plano está disponível para consulta pública até dia 5 de agosto na página da SMA . No mesmo dia 5, próxima terça, a versão será apresentada em audiência pública na Assembleia Legislativa, às 17h (av. Pedro Alvares Cabral, 201), no Ibirapuera.


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