Folha de S. Paulo


O que está acontecendo com a Bovespa

Vivemos há mais de cinco anos em um mundo financeiro comandado por movimentos de manada. São períodos de correções bruscas de preços de ativos, quase sempre motivados por previsões erradas ou especulações sem sentido.

Posso afirmar ao leitor da Folha que nos mais de 45 anos como personagem no mundo das finanças não tinha ainda vivenciado um período como este. Cresci e amadureci respeitando sempre as relações dos mercados com a macroeconomia e a política, ficando as especulações com eventos menores sempre em segundo plano. Em outras palavras, fui treinado para separar o que são só ruídos dos ventos de mudanças nas condições da economia à frente.

Meu treinamento de tantos anos foi perdendo sua eficiência na medida em que apenas ruídos, e não fatos, passaram a comandar o vaivém dos preços dos ativos financeiros de maior volatilidade. Mas não foi só comigo que isso aconteceu neste período.

Outros analistas também passaram a sofrer com as mesmas dificuldades de considerar os ruídos e sua influência decisiva na condução dos mercados em suas análises.

Alguns, dos mais importantes, optaram por uma aposentadoria precoce e passaram a dedicar sua capacidade analítica para questões mais estruturais e de prazo mais longo e, por essa razão, mais relevantes. Talvez devesse ter trilhado o mesmo caminho, mas decidi pagar para ver até quando esse jogo maluco vai prevalecer.

Essa posição tem me custado muitos dissabores, mas também tem me trazido vitórias reconfortantes. Vejamos, por exemplo, o que vem acontecendo com o índice Bovespa nos últimos 12 meses, depois de o presidente do Fed dar as primeiras indicações de que estava na hora de começar a reverter a política monetária nos EUA. Isso foi em junho de 2013 e, a partir daí, os mercados começaram a precificar o caos monetário nos emergentes e as cotações passaram a seguir movimentos senoidais ao redor de um mesmo eixo.

Segundo um grande número de analistas, com uma nova política de juros na maior economia do mundo, haveria uma migração brusca e intensa de recursos dos mercados emergentes para Wall Street. Sinal para que a manada iniciasse sua corrida maluca de retirada de dinheiro dos fundos dedicados -títulos de juros, taxas de câmbio e ações- ao mundo emergente, provocando em junho do ano passado uma primeira onda de venda na Bovespa.

O índice, que estava estabilizado nos 55 mil pontos havia algum tempo, começou a cair de forma vertiginosa, chegando aos 45 mil pontos ao final de julho. Uma queda de quase 20% em menos de 30 dias.

Já em agosto de 2013 a Bovespa começava um movimento de recuperação, voltando aos 55 mil pontos entre outubro e novembro. Uma alta de 22% em um espaço de três meses, período em que o Fed afirmava e reafirmava que a normalização dos juros deveria ocorrer apenas por volta de 2016.

Mas essa recuperação durou muito pouco e já em dezembro a Bovespa cruzava novamente a marca dos 50 mil pontos, chegando, em meados de março, aos 45 mil pontos.

O detonador desse movimento foi a decisão do Fed de iniciar a redução do volume de compra de títulos do Tesouro americano no mercado secundário desses papéis.

Mais uma vez especuladores e investidores ignoraram as mensagens de que o Fed manteria, ainda por muito tempo, os juros próximos de zero em suas operações de um dia com o sistema bancário. Estamos assistindo agora a uma nova senoide nos índices Bovespa, com o mercado recuperando os 52 mil pontos anteontem.

Esse vaivém é uma verdadeira loucura se considerarmos que o estado da economia brasileira nesse período não apresentou nenhuma mudança significativa.

Apenas o mau humor dos mercados com o governo Dilma apresentou uma deterioração da magnitude da variação da Bovespa.

Era preciso acreditar em uma catástrofe, como o Brasil caminhando na direção da Venezuela ou da Argentina, para sancionar a Bovespa nos 45 mil pontos. E, se a próxima pesquisa eleitoral Datafolha mostrar uma queda na intenção de voto da presidente, certamente o Ibovespa voltará ao nível dos 55 mil pontos.

Pobre investidor brasileiro!


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