Folha de S. Paulo


PIB negativo, educação positiva

Às vezes eu temo me transformar em um economista de uma nota só, a taxa de câmbio. Mas, na última semana, reagindo à queda do PIB trimestral de 0,5%, acompanhado por variação negativa dos investimentos, Antonio Delfim Netto, nesta Folha, atribuiu o fato ao câmbio. Calculou que, entre 2002/07 e 2008/13, a queda das exportações e o aumento das importações levaram a uma "fantástica redução da demanda externa de US$ 275 bilhões" e perguntou: "Por que um industrial iria investir nessas condições?"

Alguém poderia responder que, em compensação, empresários industriais viram o mercado interno aumentar. Mas todo o aumento ocorrido foi "comido" pelas importações: aumentou a produção dos países que exportam para o Brasil. A valorização cambial e a perda de competitividade decorreram das entradas de capitais dos quais não necessitamos, do uso abusivo da apreciação cambial para controlar a inflação e de salários crescendo mais que a produtividade.

Ao contrário do que afirmam os economistas, tanto os liberais quanto os desenvolvimentistas, o principal problema da economia brasileira não está relacionado com a política fiscal, nem com a política de juros. E muito menos com a educação de baixa qualidade. A quase estagnação é resultado de um câmbio valorizado, que impede investimentos.

Embora não haja nada mais importante para o desenvolvimento de um país do que a educação fundamental, seus efeitos só se fazem sentir no longo prazo. Na verdade, desde a transição democrática de 1985, a sociedade brasileira, pela primeira vez na sua história, vem empregando os melhores esforços para resolver o problema da educação fundamental, tanto assim que, no mesmo dia em que saiu o PIB negativo, saiu a informação que o Brasil foi, entre os 65 países que participaram do exame Pisa, o que mais avançou em matemática: 9,8 pontos.

É verdade que o Brasil continua em uma colocação muito baixa, em 58º lugar no Pisa, mas o importante é que estamos avançando. Assisti recentemente a uma conferência de Aloizio Mercadante e fiquei impressionado com os avanços que estão ocorrendo, resultado da liderança de políticos como ele e como o saudoso Paulo Renato de Souza, do esforço de milhares de educadores, e do apoio decidido dos brasileiros.

Mas será razoável comparar o grande apoio que hoje a sociedade brasileira dá à educação com a resistência que demonstra em relação a um câmbio competitivo? Acredito que sim.

Primeiro, porque, dada a tendência à sobreapreciação cíclica da taxa de câmbio existente nos países em desenvolvimento, não se pode deixar o problema por conta do mercado. É preciso que, como no caso da educação, haja uma política deliberada nessa direção.

Segundo, porque essa política não é popular; ela implica, no curto prazo, uma redução do consumo de todos. Ora, não obstante seja muito rápido e muito alto o retorno de uma política desse tipo em termos de maior crescimento e maiores salários, a sociedade brasileira não compreende esse fato, e seus economistas não ajudam a esclarecê-la; são vítimas da preferência pelo consumo imediato, implícita em deixar o câmbio como está.


Endereço da página: