Folha de S. Paulo


Em casa ou fora: é tempo de lámen

Thays Bittar/Folhapress
SÃO PAULO, SP, 14.11.2016 - O lámen shoyu, macarrão japonês, do restaurante Jojo Ramen na região do Paraíso em São Paulo (SP). (Foto: Thays Bittar/Folhapress)
O shoyu lámen do Jojo

A coisa começou uns dois anos atrás: vi a série do chef nova-iorquino David Chang, em que ele procurava uma comida, produto ou receita até exaurir o assunto. Chamava "The Mind of a Chef" (a mente de um chefe, em tradução para o português), e dava para ver que a cabeça do chef é bem louca, obsessiva e perfeccionista. Três temporadas estão disponíveis no serviço de vídeos Netflix, e o episódio que bateu forte foi sobre lámen.

Em sua busca, Chang foi para o Japão comer, experimentou caldos e massas, pesquisou e, depois, inventou pratos. Quando assisti, era inverno no Brasil, como é agora, e tive um surto de lámen em casa.

Fiz visitas à Liberdade, comprei pacotes de todas as massa possíveis, usei caldos prontos, caldos básicos —ou passei um dia inteiro fazendo um caldo. No fim, venceu a receita dada por Shizuo Tsuji no melhor livro de comida japonesa que tenho. O tomo se chama "Japanese Cooking - A Simple Art" e é organizado por M.F.K. Fisher, a grande escritora de comida —e minha musa inspiradora.

O segredo maior do lámen é o "dashi", como é chamado o caldo, que é a base da comida quente japonesa.

"Dashi" é coisa séria, autoral, orgulho dos cozinheiros. O mais básico, translúcido, que usei na minha fase lámen, era muito simples, com sabor longo e profundo: água pura, "kombu" (a alga gigante, vendida seca) e escamas de peixe bonito seco. Só isso.

Então, como sempre acontece nessas fases monotemáticas, cansei. Enjoei mesmo —a simples palavra lámen me fazia revirar os olhos de fastio e desinteresse.

Isso somado ao fato (confesso) de não ser um fã de sopas. Na minha infância, todo almoço e jantar tinha sopa como primeiro prato, e diferentes. Algumas ainda tenho vontade de voltar a provar, como a sopa creme de sagu, a de mandioquinha e a "curativa" de fubá torrado das tias, que evitava qualquer gripe. Mas nunca terão aquele sabor, então deixo para lá.

Com o vinho entrando na minha vida, meu interesse por sopas diminuiu ainda mais —muito líquido nas refeições, não combina e não interessa.

Mas fui ao JoJo Ramen, de tanto ouvir por amigos que era excepcional. Tomei o lámen, claro, com massa excelente, caldo delicado, rodela de porco defumado saboroso. Estava tudo uma perfeição, uma refeição completa e de preço muito bom (as grandes filas são justificadas).

Mas eu queria passear no cardápio e fiquei mesmo fã do "karaage", que vou descrever, hereticamente, como nuggets de frango com molho tártaro. Uma delícia. É o único prato que eles vendem para viagem, pois não tem caldo. Nas vezes em que fui comer o lámen, trouxe minha marmitinha de "karaage" para casa.

Não preciso contar, dá para intuir: reabri a temporada de lámen caseiro. Assim que acabar de escrever, seguirei para a Liberdade com minha lista de compras.

JOJO RAMEN
Onde: r. Dr. Rafael de Barros, 262, Paraíso, tel. 3262-1654
Quando: seg. a sex., das 11h30 às 14h30 e das 18h às 22h; sáb., das 12h às 15h e das 18h às 22h; fechado no domingo.

*

'No soup for you'
Já está virando mantra: não precisa de vinho sempre. Tem coisas que pedem outras bebidas. Ou nenhuma, no caso de sopas. Não tem vinho para combinar com lámen, dado o grande volume de líquido e o estilo da comida. Nada convida a tomar um tinto, por exemplo. O vinho no contexto é um ruído, desnecessário, redundante, incômodo. Lembrei daquele episódio da série "Seinfeld" sobre o sujeito que fazia a melhor sopa de Nova York, mas que era completamente maníaco. Qualquer deslize do cliente (pedir para mudar algo na receita, como "menos pimenta" ou "uma torrada, por favor") era suficiente para fazer o chef explodir de ódio e banir o coitado a um período sem acesso às suas magníficas receitas, com uma frase seca: "Não tem sopa para você". Levar vinho para acompanhar o lámen me parece dessa ordem. Eu também condenaria o equivocado a um período sem direito a JoJo Ramen. Para outras ocasiões, sugiro (abaixo) alguns bons vinhos que provei na semana.

Tem sobremesa!
Lugares de comida japonesa não se notabilizam por doces. Em geral, a refeição termina com uma fruta ou uma coisa que soa sem graça para nosso apetite todo trabalhado na cultura europeia, de doces cremosos e intensos. O JoJo Ramen oferece uma surpresa: sobremesas com a assinatura de Viviane Wakuda. Comi uma musse de manga que foi um bônus: tamanho e doçura certos para o que eu precisava depois da tigelona de lámen.

Vinhos da semana

(1) Zuccardi Serie A Malbec, R$ 110 (ravin.com.br ).
(2) Arbin Domaine de l'Idylle, R$ 92 (delacroixvinhos.com.br ).
(3) Ciranda Tinto, R$ 62,03 (mistral.com.br ).
(4) Esporão Alandra Tinto, R$ 47 (wine.com.br ).

* valores de referência

A coluna "Volta & Mesa" é publicada aos domingos na revista sãopaulo

Eduardo Knapp/Folhapress
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