Folha de S. Paulo


Matcha, o chá verde, pode ser quente ou frio, para beber ou comer

Alberto Rocha/Folhapress
Bolo de matcha e frutas preparado por Vivianne Wakuda
Bolo de matcha e frutas preparado por Vivianne Wakuda

Chá verde em pó, o matcha está cada vez mais conhecido (antes, fora de restaurantes japoneses, falar essa palavra tinha como resposta apenas um franzir de testa, ahn?). Já é servido quente ou frio em muitos lugares e vendido em latinhas fáceis de achar. Mas seu uso na culinária ainda não está tão difundido.

Não é nenhuma aberração usar coisas de beber em receitas "sólidas": há profusão de bolos, doces e até pratos salgados com café. E sempre é bom lembrar que chocolate era apenas bebido, amargo, quando foi levado do México para a Europa. Só no século 19 os senhores suíços Lindt e Sprüngli tiveram a ideia de colocar leite e fazê-lo sólido nas barras de chocolate, pelo menos é como a história é contada.

Pois eu queria comer matcha em boa confeitaria e apelei para a mais entusiasmada (e talentosa) pâtissière que conheço aqui, com formação nipo-francesa: Vivianne Wakuda, 29. Foi palpitante (deu uma taquicardia e não foi a cafeína) quando ela disse que viria em casa fazer um bolo de matcha e conversar sobre o assunto.

Uma chef-confeiteira na minha cozinha ultradoméstica, com equipamento caseirinho, sem qualidade, forno instável, para a prática da mais exigente área da gastronomia? Fiquei me sentindo num canal de vídeo, esperando a convidada, atônito.

Wakuda tem o melhor dos dois mundos na sua formação, trabalhou na Douce France, sob Fabrice LeNud, absorvendo técnicas francesas. Depois, morou no Japão, aprendendo numa das mais antigas confeitarias do país, a Osoumenya, em Fukui, que data de 1699.

O Japão ensina o aperfeiçoamento de algo até o impossível, é um ensino vertical de uma atividade. Se você faz bolinho, ele tem que ser o perfeito de acordo com uma tradição de quase mil anos. É a repetição em busca da melhora invisível.

Ela deve ter imaginado a balança que tenho (lindo design da Braun, mas sem precisão alguma) e trouxe a farinha já medida e peneirada com o matcha (leia ao lado sobre os tipos de chá). Achei boa ideia e anotei -eu ainda achava, nesta altura, que ia conseguir reproduzir o bolo. Fez em minutos o que eu levaria uma tarde: assou um bolo aerado, tipo pão-de-ló, fatiou na horizontal em três camadas (foi quando parei de anotar).

Enquanto o bolo assava, bateu chantilly, quase teve que fazer no braço, mas achei numa gaveta o batedor elétrico. Misturou matcha no chantilly, que ficou verdinho. E montou tudo. Vai pouco açúcar na receita, na tradição japonesa, o que permite perceber melhor o gosto verdoso e quase terroso, com leve amargor do matcha. Confesso que ganhei o que sobrou, e comi.

Aiizomê. Al. Fernão Cardim 39, Jardim Paulista, tel. (11) 96488-7708. viviannewakuda.com.br

Alberto Rocha/Folhapress
Vivianne Wakuda faz bolo de matcha e frutas
Vivianne Wakuda faz bolo de matcha e frutas

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O chá e o matcha
Tudo que se chama chá vem da mesma planta, a Camellia sinensis. São suas folhas, tratadas de diferentes maneiras, que resultam em chás verdes, pretos, brancos, oolongs e pu-erhs. A confusão é falarmos em chá de cidreira ou de camomila. Tudo que não é do arbusto da Camellia é infusão ou tisana. O matcha é de folhas que terminam sua maturação na sombra, e que, depois de colhidas, passam por secagem no calor do fogo. Daí finamente pulverizadas, transformadas nesse pó quase como giz verde intenso e brilhante. Evidente que há de todas as qualidades. As superiores, usadas para a cerimônia do chá, são muito caras e não são as ideais para receitas, pois o volume empregado é grande. Usamos o da marca Ujinotsuyu. Tenho bebido o que sobrou da latinha de 40 gramas e não faz feio na xícara.

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Vinho com chá
A escolha mais evidente para beber com um confeito elaborado com matcha é chá, claro. Com Vivianne Wakuda, provamos vinho Madeira. Ficou muito bom. O Madeira é pouco doce e oxidativo, tem aquele traço de coisa antiga. Mas, depois que ela foi embora, comi mais alguns pedaços da sobremesa e pensei que um espumante de uva Moscatel, cuja qualidade é alta nos vinhos brasileiros, seria um par bem interessante para o doce. Os mais secos, mesmo assim bem aromáticos, são uma delicadeza extra no par vinho e comida. Não me decidi, acho que vai depender mais da hora do bolo de matcha. O Madeira, menos festivo e mais para a mesa comportada das 5h da tarde.

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Vinhos da semana
(1) Duke of Clarence Rich Blandy's, R$ 169 (Mistral).
(2) Henrique & Henriques 3 years Full Rich, R$ 92 (Zahil).
(3) Moscatel de Setubal Bacalhoa, R$ 80 (Portus).
(4) Espumante Aurora Moscatel, R$ 33 (Vinhos e Vinhos).

*valores de referência


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