Folha de S. Paulo


Fofoqueiros profissionais estão sendo expulsos dos escritórios

Amir Cohen/REUTERS
Fofoqueiros profissionais estão sendo expulsos de escritórios
Fofoqueiros profissionais estão sendo expulsos de escritórios

Duas semanas atrás, visitei uma produtora de mídia na parte leste de Londres. O escritório estava lotado de hipsters, sentados diante de grandes mesas sob um teto de concreto.

"O clima aqui é excelente", disse o sujeito que estava me mostrando o escritório. Acenei em concordância, embora não estivesse sentindo clima algum. Naquele templo da modernidade cool, ninguém estava falando. Todo mundo trabalhava em silêncio.

Em todas as minhas visitas a escritórios, desde aquele dia, tenho mantido os ouvidos abertos, e em cada uma delas percebi a mesma coisa: nenhum som exceto o gentil estalido dos teclados dos computadores. O pessoal dos escritórios modernos parece não conversar.

Acabo de voltar de um passeio pela redação central do "Financial Times". Quase todo mundo estava em silêncio, contemplando telas. Naquele amplo espaço, só percebi dois grupos de pessoas falando, e nos dois casos estavam discutindo trabalho.

Não era assim, no passado. Há duas décadas, os dias de trabalho começavam com um bate-papo compulsório de 15 minutos sobre os programas de TV da noite anterior. Qualquer pessoa que tivesse voltado recentemente de férias, ou de uma licença-maternidade ou paternidade, ou que tivesse feito qualquer outra coisa interessante, chegava com fotos, e as mostrava aos colegas.

Papeávamos sobre os grandes temas do momento e sobre o que comeríamos no almoço. Acima de tudo, fofocávamos uns sobre os outros. Em momentos de pausa, era perfeitamente normal caminhar pelo edifício em busca de alguém para uma conversa.

Acabei de passar pela mesa de um colega, onde parei por um instante para uma conversa, como costumava fazer no passado. Perguntei a ele por que as pessoas não papeiam mais no escritório. A resposta dele, com um olhar ostensivo para o relógio, foi que agora todo mundo tem trabalho demais a fazer. Essa é a resposta que todo mundo oferece —mas simplesmente não é verdade.

Há poucas indicações de que as pessoas estejam trabalhando tanto que fica difícil conversar com os colegas. De acordo com o Serviço de Estatísticas do Trabalho dos Estados Unidos, os trabalhadores em escritórios americanos dedicam menos de três horas ao dia a trabalho produtivo; o restante do tempo é dedicado a sites de notícias e à busca de um novo emprego on-line.

Das cinco horas desperdiçadas a cada dia, só 45 minutos são dedicados a conversas.

O que nos impede de papear não é que estejamos ocupados —é que desejamos parecer ocupados. Andar pelo escritório com um ar de determinação confere status. Já se acomodar em uma cadeira e contar uma história engraçada a um colega não só pode subtrair status como restringir as possibilidades de carreira.

Os edifícios de escritórios fizeram sua parte, na eliminação das conversas. Os melhores papos costumavam acontecer entre duas pessoas, por trás de portas fechadas. Escritórios sem paredes não beneficiam o bate-papo, e quando combinados a sistemas que não têm posições fixas de trabalho, as consequências são fatais.

A pessoa sentada na mesa ao lado será não só alguém que você mal conhece como provavelmente estará usando fones de ouvido. Mesmo que você tente puxar conversa, ela não seria capaz de ouvir.

A maioria dos escritórios inclui espaços comunitários onde as conversas supostamente deveriam acontecer. Mas mesmo essas áreas não favorecem fofocas deliciosas e sem rumo definido, porque em geral estão ocupadas por pessoas com crachás pendurados do pescoço, conduzindo reuniões sisudas.

Nesses ambientes nada hospitaleiros, os fofoqueiros profissionais estão sendo forçados a sair. Cada departamento costumava ter um par de personalidades expansivas que praticamente fofocavam o dia inteiro, mas a cultura empresarial moderna requer que todo mundo se comporte da mesma maneira anódina. Não há espaço para pessoas barulhentas.

E não só os bate-papos são desencorajados como há menos sobre o que conversar. Ninguém mais assiste aos mesmos programas de TV, e se alguém quer impressionar os amigos com as fotos das férias, prefere fazê-lo no Facebook.

O maior responsável pela morte do bate-papo é o mais óbvio —a Internet. Ela nos permite vadiar fingindo que estamos imersos no trabalho. Pior, a Internet tornou a conversa obsoleta. O e-mail nos ensinou há muito tempo que é mais fácil digitar uma mensagem para alguém sentado a 10 metros de distância do que cambalear da cadeira e ir até a pessoa para uma conversa.

Porque as conversas eram o principal motivo para ir ao escritório, a situação atual é mais que preocupante: é uma tragédia. Para me certificar, liguei para o sujeito que tinha servido de guia em minha visita à produtora de mídia, e perguntei se as pessoas conversavam, por lá. Ele respondeu que elas certamente conversavam. Conversavam o tempo todo.

Quando comentei não ter ouvido conversa alguma, ele riu condescendentemente e disse uma das coisas mais tristes que já ouvi: "Conversamos no Slack".

Tradução de PAULO MIGLIACCI


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