Folha de S. Paulo


Formato de histórias curtas em quarto de hotel de quinta favorece 'Room 104'

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Rita Lee, em retrato de Guilherme Samora/Divulgação Ela lança dropz, um série de contos, pela globo livros ***DIREITOS RESERVADOS. NÃO PUBLICAR SEM AUTORIZAÇÃO DO DETENTOR DOS DIREITOS AUTORAIS E DE IMAGEM***
Jay Duplass, cocriador de 'Room 104', da HBO, atua em um dos episódios da série

Entre séries espetaculosas ("Game of Thrones"), estridentes ("House of Cards"), subversivas ("Breaking Bad"), provocadoras ("Black Mirror") ou puramente divertidas, encondem-se aquelas menores, esquisitas, incômodas que, com mais ou menos sucesso, podem ser descritas como "experimentalistas". "Room 104", da HBO, se inscreve aí.

É um rótulo puído, que pode servir a coisas tão díspares como as obras de Jill Soloway (as ótimas "Transparent" e "I Love Dick", ambas da Amazon) e o sensível teleteatro "Horace and Pete", que o comediante Louis C.K. levou ao ar em seu site em 2016 (mediante alguns dólares cobrados do espectador).

Quase sempre, porém, são séries de audiência menor, que apelam aos que preferem um humor perverso, seja por drama ou por provocação.

Os irmãos Jay e Mark Duplass, criadores da série, jogam nesse time.

Jay trabalhou com Soloway em "Transparent" (ele é o filho do personagem de Jeffrey Tambor), e afirmou certa vez em entrevista que a grande epifania cinematográfica da dupla veio em "Arizona Nunca Mais", dos irmãos Coen –não por acaso, os ídolos de 90% dessa gente esquisita, esta colunista incluída. Mark, por sua vez, é a estrela de "Togetherness", e sua persona eternamente desconfortável é a mesma que ele exibe em prêmios e entrevistas.

Essas informações aleatórias (Soloway + Coen + desconforto) explicam a promessa de "Room 104", uma série-antologia em que histórias curtas são narradas dentro de um mesmo quarto de hotel vagabundo. Os irmãos já tinham feito para a HBO a mais palatável "Togetherness"; em "Room 104" a ordem é explorar até psicopatia infantil.

No episódio de estreia, que foi ao ar no início de agosto, uma baby-sitter suspeita que o garoto de quem toma conta, no tal quarto 104, tenha dupla personalidade; o episódio passeia entre o suspense clássico, daqueles em que as coisas se escondem atrás da porta (não se trata de spoiler), e risos nervosos.

No segundo episódio, protagonizado por um James Van der Beek (sim, "Dawson's Creek") pouco à vontade, um entregador de pizza (Clark Duke, o estagiário de "The Office") é atormentado pelos fetiches sexuais de um casal instável.

No terceiro, com Orlando Jones ("Deuses Americanos" ), a ideia de salvação religiosa é questionada.

Em comum, entre idas e vindas de tempo e época, há o intuito de fazer do espectador um voyeur e confundi-lo —com o que ele vê na tela ou com suas próprias reações.

É sintomático ver a série ora definida como comédia ora como terror ou drama ou suspense.

Após a estreia excelente, os capítulos têm se mostrado irregulares. Mesmo assim, "Room 104", com 12 episódios neste ano, já teve nova temporada anunciada.

Certamente o formato de narrativas independentes —e curtas, com pouco mais de 20 minutos, algo raro no subgênero— é atraente ao público sem tempo nem paciência para se comprometer com mais uma história arrastada. O risco é esquecê-lo rápido demais.


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