Folha de S. Paulo


Com Billy Bob Thornton, 'Goliath' é alento aos órfãos de anti-heróis

Para o espectador carente de um personagem da linhagem de Don Draper ("Mad Men"), Walter White ("Breaking Bad") e Frank Underwood ("House of Cards"), Billy McBride, o protagonista do drama jurídico "Goliath", é um rega-bofe após um enervante jejum de anti-heróis carismáticos.

A produção da Amazon trouxe merecidamente o Globo de Ouro de melhor ator em série dramática a Billy Bob Thornton apenas dois anos após ele receber o mesmo prêmio pela genial "Fargo".

Thornton, cujos recorrentes papéis de tipos instáveis jamais redundam em monotonia, dá vida a Billy McBride, um advogado que já foi estrela e hoje vive acuado entre seu ego e sua consciência, assombrada pela defesa de um assassino.

Seu Billy não está muito distante do Saul/Jimmy de Bob Odenkirk em "Better Call Saul", uma derivação de "Breaking Bad" produzida pela Netflix. Comparar as duas, entretanto, é como relacionar uma montanha-russa ao embalo de um berço.

Colleen E. Hayes/Divulgação/Amazon Prime
Billy Bob Thornton é Billy McBride, advogado e protagonista de 'Goliath
Billy Bob Thornton é Billy McBride, advogado e protagonista de 'Goliath'

O clichê expresso no título, remissão à surrada parábola de Davi e Golias, contrapõe o personagem de Thornton a uma empresa de equipamento bélico cliente de um gigantesco escritório de advocacia durante a investigação da estranha morte de um engenheiro.

Mas, sendo uma série de anti-herói, o ímpeto à la "Erin Brockovich" (2000) é logo atropelado por um concurso de piores movido a egoísmo e razões comezinhas, inclusive as do próprio Billy.

Há espaço para um arquivilão clássico, com direito a cicatrizes e vida na penumbra, que poderia cair no ridículo se não fosse magnificamente interpretado por William Hurt ("O Beijo da Mulher-Aranha", lembra?).

Sua dimensão superlativa, porém, logo se torna crível em um mundo no qual, além do Davi da vez, sua parceira (Nina Aranda, quase tão explosiva no set quanto é nos palcos), os clientes, as testemunhas, a possível mocinha, a polícia, o padre e o juiz são corruptíveis, recriando o clímax a cada um dos oito episódios.

Por trás de "Goliath", que já teve segunda temporada anunciada, estão o roteirista Jonathan Shapiro ("Lista Negra") e o produtor David E. Kelley, que assina alguns dos dramas legais mais bem sucedidos das últimas duas décadas, como "Ally McBeal" e, com Shapiro, "Boston Legal" e "The Practice".

Kelley, que declarou que não planeja retornar à TV aberta, aliás, está duplamente no ar com o drama novelesco "Big Little Lies", na HBO. O casamento com a Amazon, concorrente da Netflix em alcance e ousadia criativa, foi uma escolha feliz.

Uma nota tecnológica: o serviço de vídeo por streaming que a gigante americana do varejo estreou recentemente no Brasil também promete acabar com a constante pergunta "onde eu vi esse ator/ouvi essa música?": assistindo às series on-line, um mero toque no cursor traz à tela os nomes e biografias de quem está em cena, a trilha e as curiosidades sobre as filmagens.


Endereço da página: