Folha de S. Paulo


Absurda, 'Santa Clarita' diverte sem exigir

Fazer uma comédia sobre canibalismo ambientada na Califórnia e protagonizada por uma ex-atriz-mirim-fofa não parece uma ideia muito promissora. Incrivelmente, "Santa Clarita Diet", sai-se com louvor do intento.

A série cômica de horror que a Netflix colocou no ar no último dia 3 (dez episódios de meia hora ou quase isso) surpreende com diálogos espertos que aos poucos descambam do nonsense para o absurdo, mais ou menos como sua personagem central, a corretora de imóveis Sheila (Drew Barrymore).

A intérprete da pequena Gertie em "E.T. "" O Extraterrestre" (1982) nunca foi uma atriz excepcional. Seu carisma, no entanto, é incontestável, e seu timing cômico, bem como seu senso de humor autodepreciativo, que a impede de se levar a sério demais, são revigorantes.

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Drew Barrymore em cena de Santa Clarita Diet, nova serie da Netflix ***DIREITOS RESERVADOS. NÃO PUBLICAR SEM AUTORIZAÇÃO DO DETENTOR DOS DIREITOS AUTORAIS E DE IMAGEM***
Drew Barrymore em cena como a Sheila de 'Santa Clarita Diet', série cômica de horror da Netflix

É sobretudo por causa de Barrymore, e de seu jeito de melhor amiga que queríamos ter, que "Santa Clarita" funciona. Dividindo a cena com o bonitão Timothy Olyphant (de "Justified", aqui mostrando que vai bem também em comédias) na pele do marido passivo e apaixonado Joel, ela torna instigante um enredo sobre uma profissional liberal/mãe de classe média alta que repentinamente se torna um zumbi.

As cenas são, muitas vezes, grotescas, mas no registro cômico nem não chegam a provocar os calafrios que, por exemplo, o excelente suspense psicológico "Hannibal" causa.

Barrymore torna fácil a tarefa de ver uma mulher devorar um cadáver, e quanto mais o nonsense prevalece sobre as previsíveis cenas de vida suburbana, mais "Santa Clarita Diet" ganha pontos. Da mesma forma que ocorre com a protagonista, a perda de limites e o mergulho no humor negro se mostra, também no roteiro, estimulante.

Na história criada por Victor Fresco (produtor de "My Name is Earl"), Sheila e Joel são um típico casal suburbano da Califórnia (vivendo na Santa Clarita do título), pais de uma adolescente e vizinhos de duas famílias de policiais, que trabalha vendendo imóveis e está junto há 25 anos. Um dia, Sheila tem uma crise violenta de vômito e descobre que está morta –ou não.

A partir daí, ela passa a querer se alimentar unicamente de cadáveres humanos, o que impõe um dilema ético para a família (quem matar? quem comer? quem merece morrer?). Ao mesmo tempo Joel busca um antídoto para o que supõe ser uma doença ancestral descrita em um antigo livro sérvio.

Uma segunda temporada ainda não foi confirmada pela plataforma de streaming, mas deve ser anunciada em breve.

Não é, obviamente, nada memorável ou que vá mudar o conceito de alguém sobre ficção –para ficar apenas nas séries de humor perverso e enredo absurdo da Netflix, "Ubreakable Kimmy Schmidt", por exemplo, está muito à frente.

É, contudo, uma distração eficiente, talvez necessária em meio a tantas séries sobre um futuro sombrio que cada vez mais parecem prenunciar o noticiário.


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