Folha de S. Paulo


Série 'Emerald City' traz sexo a 'Mágico de Oz'

Soa uma extravagância a aposta de "Emerald City", adaptação de clássico infantil em que a heroína é torturada para fornecer informações, personagens antes redentores usam meios pouco lícitos para obter poder e parte dos protagonistas é irreconhecível à primeira vista.

Mas "O Maravilhoso Mágico de Oz" (ou "O Mágico de Oz", na versão cinematográfica de 1939) e os livros subsequentes de L. Frank Baum (1856-1919) estão repletos de alegorias morais e políticas. Jornalista além de escritor, é provável que ele aprovasse a incorporação de temas atuais em 2017.

O diretor indiano Tarsem Singh, responsável pelos dez episódios da série exibida no Brasil pela Fox, entendeu isso ao recontar a história de uma moça do interior dos EUA que, em uma terra fantástica, parte em busca de um governante magnífico que supõe ter a solução para os seus problemas e se revela um charlatão (o livro é de 1901, parece que a política anda em círculos).

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A atriz Florence Kasumba na série 'Emerald City', releitura de 'O Mágico de Oz
A atriz Florence Kasumba na série 'Emerald City', releitura de 'O Mágico de Oz'

Entendeu, também, a necessidade de repetir elementos narrativos bem sucedidos, inspirando-se sem parcimônia em recursos de "Game of Thrones" e lotando seus personagens de nuances cinzentas que os distanciam do clássico em technicolor.

A personagem interpretada por Adria Arjona (a guerrilheira de "Narcos") em nada lembra a ruivinha cantarolante de Judy Garland: é uma Dorothy latina, de arma em punho e em permanente tensão sexual com o Espantalho (Oliver Jackson Cohen).

O Espantalho, por sua vez, é um homem deixado para morrer em uma cruz. Sabemos que é ele porque está coberto pela palha e porque uma amnésia torna sua cabeça vazia –ele quer que o Mágico (Vincent D'Onofrio) lhe conserte o cérebro.

A versão de Singh mistura personagens dos livros seguintes sobre Oz, como Tip, uma criança órfã que também busca o Mágico e levanta questões de gênero, e elementos de outras recontagens (as bruxas Glinda e Má do Oeste parecem disputar o posto de vilã, uma à frente de um orfanato que explora seus internos, e outra de um bordel).

A transposição é engenhosa, engrandecida pelo apuro visual que Singh já mostrara nos filmes "A Cela" (2000) e "The Fall" (2006). Figurinos e cenários são extasiantes, parte deles obtidos em locações (o palácio de Oz é o Parque Güell, obra-prima modernista de Antoni Gaudí em Barcelona). E a revelação gradual dos personagens conhecidos ajuda a fisgar o espectador.

A audiência, no entanto, caía, embora a série melhore a cada semana, e a gigante da TV aberta americana NBC não havia decidido se haveria segunda temporada até a conclusão desta coluna, quando tinham sido exibidos quatro episódios.

"Emerald City" é soturna demais para quem busca o conforto da memória afetiva e rasa demais para quem busca um drama mais denso ou uma crítica social menos simplista. Ver como Singh consegue juntar as duas coisas de forma coerente, porém, já compensa a atenção.

"Emerald City" é exibida pelo Fox1 à 1h de sexta, com reprise às 23h de terça, e on-line pelo FoxPlay


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