Há uma fórmula muito em voga para comédias curtas (dessas de 20 ou 30 minutos): pessoa levemente desajustada, com problemas de relacionamento, encontra novo amor/cidade/emprego que a faz mudar.
Quase sempre, é uma pessoa esfuziante que disfarça traços de depressão e não é tão feliz quanto parece. Mas o novo amor/cidade/emprego irá surpreendê-la e deixá-la nas nuvens -desde que, claro, ela não desperdice a chance com suas esquisitices. Afinal, a vida é boa, e basta dar atenção ao que ela oferece (ou, ao menos, queremos acreditar nisso, daí o sucesso da fórmula).
Doug Hyun/Netflix | ||
Maria Bamford interpreta comediante na série "Lady Dynamite", da Netflix |
Se você pensou em uma longa lista de séries que se encaixam nessa descrição, isso explica por que a produção televisiva (ou internética) passa por um período em que fazer rir tem sido bem mais difícil do que deixar o espectador tenso, triste ou atônito. Os dramas subiram de patamar; as comédias, com honrosas exceções, giram em looping.
"Lady Dynamite", que a Netflix lançou no fim de maio e cujos 12 episódios estão disponíveis no site, tenta quebrar a sina, mas recai nela.
A série é capitaneada por Maria Bamford, uma comediante de 45 anos cuja carreira foi construída essencialmente nos palcos de stand-up comedy e na dublagem de animações, e produzida por Mitchell Hurwitz, o mentor da ótima "Arrested Development" (sobre uma família disfuncional, outro tema central do humor americano).
Há ideias felizes, como o fato de a protagonista ser uma mulher de meia-idade menos conhecida e a opção por centrar a trama na pitoresca Duluth, no Estado de Minnesota, e não em Nova York, Los Angeles, San Francisco, Boston, Miami, Filadélfia ou Chicago -o circuito tradicional da dramaturgia americana.
Bamford é ágil e versátil, em alguns momentos conseguindo emular a perspicácia de Louis C.K. ou as lucubrações surreais de Tina Fey.
E Hurwitz tem uma queda louvável pelo bizarro, assim como a coprodutora Pam Brady, egressa da revolucionária "South Park".
A mão da dupla fica clara na escolha da locação e no foco nessa mesma classe média americana menos culta, que prefere o interior do país, menos contemplada pelas comédias espertinhas produzidas para se assistir em lote mas representada na série de animação citada.
Maria -a personagem- não é descolada; exceto pelo emprego de comediante, ela é uma mulher de meia-idade comum.
O problema é que nos últimos anos esse papel também se tornou saturado. Fica difícil bater, nesse quesito, C.K, o pioneiro Jerry Seinfeld ou mesmo Aziz Ansari e a turma do "Saturday Night Live". Bamford passa a impressão de se esforçar tanto para fazer isso que se torna cansativa para o espectador -o "dinamite" do título não é casual.
Nesse sentido, a dupla de "Broad City (do Comedy Central, que acaba de chegar ao Brasil pelo braço local do canal), Amy Schumer e Rachel Bloom (da comédia musical "Crazy Ex-Girlfriend, contemplada neste ano com o Globo de Ouro) fazem um trabalho muito melhor.
"Lady Dynamite" está disponível na Netflix