Folha de S. Paulo


Cuba na moda

O antigo primeiro-ministro espanhol José Luis Rodríguez Zapatero visitou Cuba, onde foi recebido até pelo presidente Raúl Castro, o que provocou polêmica política na Espanha.

Duas semanas mais tarde, desembarcou em Havana o chanceler italiano Paolo Gentiloni, e nos últimos dias surgiu o anúncio de que em maio o presidente francês, François Hollande, se tornará o primeiro chefe de Estado de seu país a visitar a ilha em missão oficial.

De modo paralelo, enquanto é discutida a posição coletiva da União Europeia quanto a Cuba, vão passando pela nação caribenha delegações de empresários de diferentes países, todos interessados em conhecer a situação do país e as perspectivas de negócios, depois do muito alardeado anúncio do início de conversações entre Cuba e os EUA para o restabelecimento de relações diplomáticas.

O interesse por Cuba, que se estende do político ao comercial, do midiático ao social, disparou nos últimos meses, e ainda que o país sempre tenha sido alvo de atenção, hoje em dia esta supera todas as expectativas. Estamos na moda.

Nas últimas semanas, fiz uma viagem para promover meus livros na Espanha, em Portugal, na Grécia e na França, e nunca havia sido tão procurado pela imprensa, sob o pretexto de falar sobre meus livros, mas com o verdadeiro propósito de ser questionado sobre o que aconteceu, está acontecendo e pode acontecer em Cuba neste novo cenário.

Para um escritor que, ademais, não tem qualquer espaço nos centros de decisão da ilha e cujas informações em geral são obtidas na imprensa cubana e internacional, assumir a função de analista e guru da vida cubano é um desafio muitas vezes grande demais.

Mas as pessoas querem saber mais, querem compartilhar -ou rebater- outras visões sobre as possíveis mudanças que devem estar se produzindo na ilha e, mais ainda, querem que alguém lhes revele o que esperar.

Em cada entrevista, depois de rodeios que começam por perguntas literárias, os colegas da imprensa me conduzem ao inevitável.

E ainda que eu resista e erga minha bandeira de escritor e cidadão comum, não consigo escapar.

O que aconteceu em Cuba depois do 17 de dezembro? Como mudará a sociedade após o restabelecimento das relações com os EUA? A Europa fica para trás na corrida diplomática e comercial que começou? E os países latino-americanos, como o Brasil, que estabeleceu uma posição inicial em terras cubanas?

Diante das perguntas, com um tanto de habilidade, outro de senso comum e o ingrediente de haver repetido a mesma resposta 50 vezes, consigo me sair com bastante dignidade.

O problema mais árduo começa quando o entrevistador adentra o território da futurologia e me pede, a exemplo de um da TV portuguesa, que lhe explique como Fidel Castro será visto em 50 anos.

Tive de lhe pedir que me repita a pergunta no ano de 2045, se possível no dia do meu 90º aniversário. Quem sabe então poderei lhe dar uma resposta aceitável.


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