Folha de S. Paulo


Brasil precisa aumentar ainda mais impostos sobre gasolina

Joel Silva/Folhapress
Motoristas fazem fila para abastecer em posto de gasolina na avenida Sumaré, na zona oeste de São Paulo, que anuncia a venda do litro do combustível sem a incidência de impostos, com valor de R$ 1,484, pela ação

O aumento do imposto sobre combustíveis, com consequente alta de preços, vai ser bom para o país por uma razão mais importante do que engordar o caixa do governo federal. Deve diminuir a demanda pelo uso dos automóveis e ajudar a qualidade do ar das grandes cidades, especialmente São Paulo.

O consumo de combustível e o uso do automóvel são influenciados por preço. Além de quebrar a Petrobras, muito mais do que a corrupção, a política demagógica que marcou os governos Lula e Dilma, de preços artificialmente baixos para agradar a indústria automobilística e segurar a inflação, provocou aumento do uso do carro e fez mal a todas as grandes cidades do país. A epidemia de congestionamento foi marca registrada dos governos petistas.

Menos conhecido do público, mas profundamente danoso foi o aumento da poluição e das doenças decorrentes, principalmente respiratórias. O mimo para a classe média e para as fábricas de carro foi pago com um aumento de custos para a saúde pública que vai deixar consequências de longo prazo para o país.

A taxação maior sobre os derivados de petróleo do que para o álcool também pode ser boa, se os postos mantiverem a proporção no preço para o consumidor. Nos anos passados, ao mesmo tempo em que continham o preço dos combustíveis, o governo federal reduziu a diferença entre gasolina e álcool abaixo dos 30% necessários para igualar o desempenho de consumo (os carros precisam de mais álcool para rodar a mesma coisa, por isso, o biocombustível tem que ser mais barato). Essa (falta de) estratégia quebrou o setor do álcool.

Na última terça-feira, a publicação "Nature Communications" divulgou um artigo sobre a poluição causada pelo crescimento do consumo de gasolina e redução do uso de álcool em São Paulo em função de preço durante o ano de 2011. O estudo chamado "Redução dos níveis de partículas ultrafinas na atmosfera de São Paulo durante troca de consumo de gasolina pelo etanol" foi feito por uma equipe multidisciplinar de pesquisadores de diferentes universidades, formada pelos brasileiros Alberto Salvo (economia, Universidade de Cingapura), Joel Brito e Paulo Artaxo (física, USP) e o alemão Franz Geiger (química, Northwestern University, EUA).

O artigo mostra como o comportamento do consumidor é sensível a alterações de preço e, por isso, a poluição cresceu quando o governo federal deixou o álcool mais caro.

Em verdade, uma gestão pública estratégica tem que levar em consideração vários aspectos da vida: a arrecadação de impostos, a taxa de poluição, o uso de automóvel e os transportes públicos, a tecnologia dos motores, o desenvolvimento da agricultura brasileira, etc.

Em anos passados, os prefeitos Gilberto Kassab e Fernando Haddad propuseram o aumento da Cide, tributo federal sobre combustíveis, com repasse para as metrópoles subsidiarem as tarifas de transportes públicos.

O governo Temer, que tenta sobreviver a qualquer custo, vai tapando buracos políticos e econômicos atabalhoadamente. Assim, se apropriou de uma receita que poderia melhorar os sistemas de ônibus municipais. O vampiro de Brasília chupa mais um pouco do sangue do país e deixa as tarifas dos coletivos por conta dos cofres dos municípios, muitos quebrados. É péssimo, sem dúvida.

Mas o aumento de preços vai reduzir a demanda por combustíveis, mormente derivados de petróleo, e isso tende a ter dois bons efeitos: diminuir as viagens de carro e a poluição nas grandes cidades.

A rigor, apesar da grita de donos de automóveis e caminhões, o ideal para o país é que mais aumentos ocorram, pressionando radicalmente a alteração do padrão da mobilidade e dos transportes. E com eles, poderá ser recuperada a ideia da "Cide para os municípios".


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