Folha de S. Paulo


O que ameaça a praça Victor Civita

A crise que abala o país fez mais uma vítima: a associação de empresas que patrocinava a praça Victor Civita (zona oeste) encerrou atividades no final do ano passado e devolveu à prefeitura o comando e os custos de manutenção. Um contrato provisório feito pela Subprefeitura de Pinheiros vence hoje mas pode ser prorrogado por mais um mês.

Por ironia do calendário, depois de março, não há definição para o local que leva o nome do fundador da Editora Abril. A praça é uma referência da cidade, com atividades regulares para a comunidade vizinha e eventos culturais. É local de fruição colado a um terminal de transportes públicos, em feliz conjunção.

Em 2001, a Editora Abril apresentou à prefeitura (gestão Marta Suplicy) um plano de requalificação do local onde havia uma central de triagem e incineração de lixo, foco de mau cheiro, poluição e ratos. Foi assinado um protocolo de intenções. A administração Kassab (em 2006) transferiu o processamento de detritos e a editora iniciou a implantação do projeto da arquiteta Adriana Levisky, com reforma e despoluição do incinerador, cobertura do solo intoxicado e a criação de passarelas e auditório elevados, para evitar contato com solo poluído.

Inaugurada em 2007, a gestão passou em 2012 à Associação de Amigos da Praça, com representantes da Subprefeitura de Pinheiros, da editora e patrocinadores como, em momentos diferentes, Petrobras, Itaú, Even, Vivo, Sabesp e CCR, responsáveis por cobrir os gastos fixos de cerca de R$ 2 milhões/ano (os eventos culturais têm patrocínios de terceiros).

Em dezembro essa entidade foi extinta e a parceria, encerrada. Adriana Levisky, que a coordenava, diz que o modelo se inviabilizou por falta de patrocinadores fixos. Para Meire Fidelis, diretora da Abril, os sinais de esgotamento começaram em 2014, com o agravamento da crise econômica.

A arquiteta Levisky acha que a cidade precisa criar modelos mais adequados aos tempos de crise. A avaliação da Abril é semelhante: "O recado para a cidade é que o mundo mudou, é preciso mudar o relacionamento", diz Fidelis.

As leis de incentivo cultural, como a Lei Rouanet, são baseadas em renúncia fiscal; na recessão, o imposto cai ou desaparece, não há o que doar. O poder público também perde arrecadação. As empresas conseguem maior impacto em ações eventuais, com menos investimento que o custeio permanente de um espaço público. Quando seriam mais importantes as parcerias, elas escasseiam.

A Subprefeitura de Pinheiros, em nota à coluna, diz que com o encerramento do convênio, "está em vigor um termo de doação de serviço, entre uma empresa privada e a subprefeitura, com prazo até fevereiro de 2016, com possibilidade de prorrogação por mais 30 dias. As atividades culturais seguem normalmente e a subprefeitura está em tratativas com a Secretaria de Cultura para implantação de agenda cultural permanente na praça".

Nas próximas semanas, a prefeitura deve estabelecer um novo modelo de gestão da praça. O ideal seria estudar também regras que deem retorno a empresas interessadas (através de atividades pagas, venda de ingressos ou exploração de serviços como restaurantes), para que o custeio não seja coberto apenas por benemerência, qualidade ameaçada em tempos de crise.


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