Folha de S. Paulo


Aperte o cinto, esqueceram o pedestre

O número de atropelamentos caiu 16% na cidade de São Paulo desde o início do ano. Isso é um avanço e deve ser comemorado. Ainda assim, São Paulo é muito violenta para quem se desloca com o que Deus nos deu: os pés. Em números absolutos, é a capital que mais mata (há outras mais violentas proporcionalmente). É preciso avançar mais para garantir à maior cidade do país números de Primeiro Mundo, como já ocorreu com a mortalidade infantil.

Questionado sobre a falta de ações voltadas aos pedestres entre as medidas da prefeitura para mobilidade (faixas exclusivas de ônibus, ciclovias e redução dos limites de velocidade nas ruas), o prefeito Fernando Haddad (PT) disse que a forma mais eficiente de melhorar a segurança do trânsito é diminuir a velocidade. E lembrou as reduções de acidentes alcançadas desde o início dessa ação.

Reduzir a velocidade máxima para 50km/h na maioria das ruas (em algumas poucas, 70 km/h) é excelente para uma série de aspectos: melhora o fluxo e por isso o tempo médio de deslocamento (porque caem os acidentes que engarrafam as vias); diminui os acidentes e reduz sua violência. Até aí, acerta o prefeito e erram os críticos.

No entanto, a resposta na entrevista à rádio CBN na manhã de sábado (24), em que participei como entrevistador, foi um jeito de escapar da questão sobre o fim da campanha de respeito no trânsito, que ensinava motoristas a pararem nas faixas exclusivas e, transeuntes, a fazerem sinal com a mão para anunciar o desejo de atravessar.

Iniciada pela administração anterior (e políticos sempre gostam de ações com sua marca), a campanha foi inspirada na experiência bem-sucedida da administração petista de Cristovam Buarque (1995-1998) no Distrito Federal, que, desde então, se tornou um orgulho suprapartidário da capital federal.

Quem anda a pé em São Paulo deve ter notado que, mesmo em ruas que já tiveram a velocidade reduzida, o desrespeito às faixas voltou a padrões trogloditas: há sempre carros aproveitando uma chance de atravessar o cruzamento quando o sinal já está vermelho para eles.

Isso é sinal de falta de educação no trânsito, que independe de velocidade ou veículo. "É importante saber que alguns ciclistas se comportam muito mal, como os maus motoristas de automóveis", alertou o urbanista colombiano Ricardo Montezuma em entrevista à Folha no mês passado, quando também disse: "É preciso dar prioridade às pessoas, não aos veículos (incluindo bikes)".

Criador da Fundação Cidade Humana e um dos responsáveis pelo pacote de melhorias urbanas que mudou a mobilidade e a civilidade dos moradores de Bogotá, Montezuma chega nesta segunda (26) a São Paulo para conhecer o projeto de ciclovias da cidade. Na quarta (28), a partir das 9h30, fará uma conferência no Instituto de Engenharia (av. Dr. Dante Pazzanezze, 120), aberta ao público, quando vamos lançar o aplicativo de celular "SP Sem Carro".

O prefeito tem planos para reduzir os atropelamentos –ele mesmo alertou para a insuficiência da queda destes. É imperioso voltar a promover ações educativas em vias públicas. Entre outras medidas adotadas em Bogotá, palhaços chamavam atenção dos motoristas que desrespeitavam regras. Não é preciso ser agressivo, mas é fundamental estar presente para ensinar, vigiar e punir. E assim assegurar o respeito ao pedestre, em qualquer velocidade.


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