Folha de S. Paulo


Criatividade tira energia de resíduos

Brasil vive o risco de novo apagão ou restrição ao consumo de energia elétrica. Ao mesmo tempo, o governo federal autoriza fortes aumentos na conta de luz. Os erros de planejamento do setor foram amplificados pela imprevidência dos descontos eleitoreiros, em 2013, que provocaram aumento de consumo quando a seca já reduzia reservatórios.

A crise energética que enfrentamos, porém, tem causa profunda: os planejadores oficiais se voltam quase exclusivamente para as matrizes hidrelétrica e termoelétrica. E os dois modelos nos expõem a problemas: reservatórios baixaram em grande parte do país e a produção com derivados de petróleo é mais cara que a hídrica.

Há anos diversos países já aumentam muito a contribuição de formas alternativas de energia, como solar, eólica e com biomassa.

É exatamente neste segmento que atua o empresário brasileiro Paulo Puterman, que nas últimas décadas foi responsável pela criação de diferentes empresas voltadas para a inovação e hoje apresenta a investidores e analistas em Nova York um projeto de produção de energia elétrica a partir da queima de resíduos industriais, como madeira, papel, plásticos e pneus.

O que para alguém pode parecer um resto imprestável de um processo é a matéria prima de um processo físico-químico inovador.

Normalmente, a produção de energia por processo térmico é baseada na geração de calor para produzir vapor, que move um motor e gera eletricidade. A novidade do processo patenteado pelo empresário é que a queima da madeira produz gás, usado como combustível por um gerador, com conversão melhor do que se envolvesse vapor.

Puterman criou um modelo baseado em pequenos geradores, miniaturizando o processo para que possa ser implantado em condomínios e pequenas empresas. A eletricidade pode ser usada em processos internos ou vendida a consumidores externos.

Sua primeira unidade, que serviu de laboratório e se tornou o primeiro módulo produtivo, está instalada junto a uma recicladora de Jacareí (SP), que recebe resíduos lenhosos de grandes empresas da região e mói para produzir um pó, vendido para queima em processos industriais. O equipamento implantado pela empresa de Puterman (chamada 120pW) usa essa madeira para a produção do gás e a energia elétrica gerada é utilizada para mover as máquinas internas.

Esta é a segunda iniciativa de Puterman no segmento. A primeira, Sykué Bioenergia, se tornou tema de estudo da escola de negócios de Harvard. Em 2011, ele vendeu sua participação e passou a se dedicar a um doutorado em Biotecnologia na USP, que resultou na tese "Renovável e Armazenada, Possível Contribuição da Energia Solar para a Manutenção da Sustentabilidade e Segurança da Matriz Energética Brasileira" (2013).

A nova empresa atende duas demandas contemporâneas: de energia elétrica e por destino para os resíduos de processos econômicos, principalmente industriais.

Por exemplo: São Paulo gera 50 mil toneladas de podas de árvores a cada ano. Segundo o cálculo de Puterman, essa madeira pode produzir eletricidade para 25 mil casas ao longo de um ano.

Enquanto Brasília segue obcecada com a construção de hidrelétricas, um projeto brasileiro inovador deve ser exportado para os EUA, para produzir energia elétrica barata enquanto ajuda a solucionar o problema do descarte de resíduos de metrópoles.


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