Folha de S. Paulo


Jean Wyllys critica Maduro, mas ainda defende causas da crise venezuelana

Alan Marques/Folhapress
O deputado Jean Wyllys (PSOL-RJ) durante discurso contra o relatório do deputado Ricardo Izar (PP-SP), no plenário da Câmara dos Deputados
Jean Wyllys (PSOL-RJ) discursa contra o relatório do deputado Ricardo Izar (PP-SP), na Câmara

"O sistema capitalista imperialista mundial está conduzindo a humanidade a uma crise global", disse Nicolás Maduro durante a cerimônia de abertura da Assembleia Constituinte. O ditador venezuelano defendeu ainda "o enfrentamento revolucionário contra a ordem capitalista estabelecida", "o controle sobre a produção das grandes empresas" e a "expropriação dos grandes grupos monopólicos capitalistas".

Eu disse "Maduro"? Enganei você, leitor: na verdade, as frases e propostas acima vêm do programa do PSOL do Rio de Janeiro - o mesmo diretório que, na semana passada, rompeu com a executiva nacional e publicou uma nota com críticas ao ditador venezuelano. (A íntegra do programa está no site do partido)

Políticos têm um faro apuradíssimo para detectar sentimentos e tendências dos eleitores. Ao perceber que ficou constrangedor defender a ditadura venezuelana, alguns integrantes do PT e do PSOL pularam do barco, ignoraram antigas declarações de apoio, discordaram de colegas e viraram as costas para o governo de Maduro.

Foi bonito ver o deputado Jean Wyllys criticando com toda convicção o governo da Venezuela. "Sou contra uma farsa de constituinte com regras eleitorais pelas quais, se a oposição participasse, mesmo vencendo, perderia, porque é um jogo de cartas marcadas", disse ele.

Mas é difícil evitar a impressão de que a crítica de Jean Wyllys e do PSOL fluminense é mais estética e contra os atentados evidentes à democracia. Eles criticam a figura política de Maduro, mas ainda defendem as medidas que criaram o caos econômico na Venezuela.

A política econômica chavista consistiu em populismo fiscal, nacionalizações, expropriações e outros atentados à segurança de propriedade, perseguição a multinacionais e controle estrito do câmbio, da movimentação de capitais e das relações de trabalho.

São as mesmas medidas que o PSOL defende. Algumas propostas são até mais radicais que as chavistas. O partido acredita que "o controle sobre a produção das grandes empresas mostrará os lucros capitalistas e as possibilidades de aumentos" para os trabalhadores. E promete nacionalizações de companhias privatizadas e expropriações de grandes empresas e fazendas, "sejam elas produtivas ou não".

Outra semelhança fundamental entre o chavismo e o programa do PSOL é a narrativa de luta de classes —a ideia perigosa de que os pobres estão em má situação por culpa dos ricos ou das grandes potências. Alguns trechos do programa do PSOL parecem plágio dos discursos de Chávez. "Não estamos formando um novo partido para estimular a conciliação de classes", diz o documento. "Pela unidade dos trabalhadores e do povo da América Latina. Pela federação das Repúblicas da América Latina!"

Na nota em que criticou Maduro, Jean Wyllys disse que é "a favor da esquerda do século 21". Se é assim, ele precisa mudar com urgência seu programa partidário. Ou se filiar a um partido que não lembre a esquerda do século 19.


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