Folha de S. Paulo


Estudo mostra que humanos preferem justiça a igualdade

Mohammad Ponir Hossain/Reuters
Crianças brincam com pneus em uma fábrica de processamento de arroz em Muktarpur, na periferia de Dhaka, em Bangladesh
Crianças brincam com pneus em uma fábrica de processamento de arroz em Muktarpur, na periferia de Dhaka, em Bangladesh

Muitos estudos de laboratório de economia comportamental e psicologia evolutiva sugerem que há uma tendência humana a se opor à desigualdade.

Por exemplo, crianças de seis anos, que recebem a tarefa de distribuir um número ímpar de borrachas de apagar entre dois garotos que arrumaram o quarto, insistem para o pesquisador jogar fora a borracha sobressalente, em vez de dar uma borracha a mais para um deles. Comportam-se assim até mesmo quando não correm o risco de conhecer os garotos (ou seja, quando não há possibilidade de reprovação).

Entre adultos, jogos de laboratório mostram que voluntários preferem não ganhar prêmio algum a aceitar uma divisão muito desigual de um prêmio. E se dispõem a gastar o próprio dinheiro para punir quem foi egoísta ao dividir dinheiro com os outros.

Se o viés da igualdade é resultado da evolução, então é possível encontrar rastros dele em outros primatas, com quem compartilhamos uma boa parte da nossa história evolutiva. E há diversos exemplos disso.

O primatologista Frans de Waal mostrou que macacos-pregos, se ganham uma recompensa pior que a de seus colegas depois de realizar a mesma tarefa (por exemplo, levar pedrinhas na mão do pesquisador), jogam a recompensa fora e fazem greve. Chimpanzés vão ainda mais longe: mesmo o indivíduo que não sofreu a injustiça deixa de realizar a tarefa, em solidariedade com o colega injustiçado.

Mas um artigo publicado na "Nature Human Behaviour" questionou todos esses estudos de uma vez. Os autores, três psicólogos de Yale, dizem que a maior parte desses experimentos provam uma tendência natural a rejeitar a injustiça econômica, não exatamente a desigualdade. Quando a distribuição mais justa é desigual, a preocupação com a igualdade desaparece.

No jogo de distribuição de borrachas, a criança dá a borracha sobressalente a um dos garotos ao saber que ele arrumou o quarto melhor que o outro. Favorece o mais dedicado até mesmo se há um número par de borrachas, ou seja, quando pode dividir as recompensas de forma igualitária.

Até crianças mais novas, de três anos, agem assim. Se assistem um boneco ajudando outro a alcançar um brinquedo e um terceiro boneco atrapalhando os colegas, as crianças dão mais gratificações aos altruístas. E costumam dar pancadas no boneco antissocial.

Os autores do estudo afirmam que a tendência a se importar com a justiça econômica surgiu como uma vantagem evolutiva. Foi uma forma de recompensar os mais cooperativos e punir os "free riders", aqueles que não colaboram mas se aproveitam do esforço do grupo. "Diferente da igualdade, a justiça permite que indivíduos com diferentes níveis de produtividade dividam proporcionalmente os benefícios da cooperação", dizem os psicólogos.


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