Os defensores da idade menor para aposentadoria para as mulheres costumam recorrer ao argumento da jornada dupla. Se as mulheres se encarregam da maior parte das tarefas domésticas e da educação dos filhos, então seria justo que se aposentem mais cedo.
Fernanda Mena, por exemplo, disse aqui na Folha que "sem resolver as desigualdades que precedem a aposentadoria, fica difícil igualar os critérios para obtenção do benefício". De fato, segundo o IBGE, as mulheres trabalham 7,5 horas por semana a mais que os homens, se incluirmos na conta o serviço em casa.
O argumento, no entanto, esconde uma consequência inesperada. A menor idade de aposentadoria empurra as mulheres para a jornada dupla. Se por lei elas se aposentam mais cedo, então pode-se começar a achar natural que tenham mais responsabilidade pelas tarefas domésticas.
A idade menor seria, assim, um tiro no pé. Acabaria institucionalizando o serviço em casa como uma responsabilidade feminina.
Por causa dessa consequência, a União Europeia orienta que os países estabeleçam a idade de aposentadoria seja a mesma para homens e mulheres. A Itália, que já foi condenada pela pelo Tribunal de Justiça da União Europeia por causa da disparidade etária, está aos poucos igualando as idades. Em 2017, a aposentadoria chega aos 66 anos e 7 meses para os homens; e aos 65 anos e 7 meses para as mulheres. A partir de 2018, a idade de aposentadoria será de 66 anos e 7 meses para os dois sexos.
Na Inglaterra, a partir do ano que vem, a idade de aposentadoria feminina, hoje em 63 anos, subirá a 65 anos, se igualando à dos homens.
A idade menor baseada no argumento da jornada dupla ainda seria injusta com o homem que não se casa, é viúvo ou que cuida mais dos filhos e das tarefas domésticas que a mulher. Se o homem se encarregou da casa a vida toda, por que não deveria se aposentar mais cedo? Seria preciso individualizar os casos e arranjar um modo de medir as horas de serviço doméstico dos cônjuges.