Folha de S. Paulo


Renato Gaúcho falou em despencar, corrigiu para tropeçar e quase caiu

Lucas Uebel/Gremio FBPA/Divulgação
Renato Gaúcho controla a bola durante treino do Grêmio
Renato Gaúcho controla a bola durante treino do Grêmio

JULIA KFOURI, 9 anos, ao ver já tarde da noite com o avô a final da Liga Mundial de vôlei, saudou a vitória brasileira no primeiro set, mais dormindo que acordada: "O Brasil é bom de jogo, mas é ruim de país."

Ganhou um beijo, um abraço, um boa noite e nem viu a França virar o jogo para 3 a 2 e ganhar o torneio na Arena da Baixada, em Curitiba, 18 dias atrás.

Renato Portaluppi, 54 anos, que como treinador já ganhou o direito de ser mais do que Gaúcho, e nada contra os nascidos no Rio Grande do Sul, anunciou que o Corinthians despencaria quando estava dez pontos à frente do Grêmio e o time dos pampas acabara de derrotar o Flamengo, na Ilha do Urubu, no Rio, exatamente como o Timão havia feito na Arena Grêmio contra o Imortal: "O Corinthians vai despencar na tabela, anote o que eu estou falando para vocês: ele vai despencar. O segundo turno será um campeonato totalmente diferente", vaticinou.

Dias depois se arrependeu, se desculpou e corrigiu: "Peço desculpas porque me posicionei mal após o jogo do Flamengo. Disse que o Corinthians despencaria. Peço desculpas. Eu quis dizer que tropeçaria. Despencar fica muito mais difícil, mas vai tropeçar", esclareceu.

A língua fala e o corpo paga, diz o provérbio lusitano.

Renato sempre foi de falar muito. Quando ainda jogava, e como jogava!, prometeu sair pelado na rua caso o Fluminense caísse para a segunda divisão. Felizmente não cumpriu.

Disse também que o futebol italiano é ridículo e, mais recentemente, horrorizou o politicamente correto ao sair-se com esta: "Quem precisa aprender, estuda, vai pra Europa... Quem não precisa vai pra praia. Eu falo isso, e muitos criticaram. Disseram: 'estão trazendo um treinador que estava jogando futevôlei...' Eu pergunto, e agora? E ai? Futebol é como andar de bicicleta. Quem sabe, sabe. Quem não sabe vai estudar."

Para quem fez da irreverência marca registrada, ele procura agora passar uma imagem mais séria e faz sucesso com o futebol de seu time.

Se errou na previsão de que o Corinthians despencaria, acertou ao se desculpar e ao vaticinar os tropeços, materializados em dois empates contra equipes da parte de baixo da tabela, como o Furacão e o Avaí.

Só que quem se deu mal depois dos tropeços corintianos foi o Grêmio, com a vitória que deixou escapar entre os dedos diante do São Paulo, empate responsável pelos atuais oito pontos de diferença entre líder e vice-líder do Brasileiro.

Porque se a bola pune como ensinou o filósofo Muricy Ramalho, quem fala demais dá bom dia a cavalo.

O Grêmio, como o Corinthians em casa contra o Furacão, tinha os três pontos garantidos no Morumbi e vacilou. Só que o líder podia, tal a gordura acumulada. O vice-líder, não, tem de correr atrás para diminuir o prejuízo e ainda quase caiu do cavalo no minuto final contra o Tricolor paulista.

Entre tantos clichês da sabedoria popular está também o que diz que cautela e caldo de galinha não fazem mal a ninguém.

Fábio Carille, o técnico corintiano, tem sabido segui-lo à risca.

E, diferentemente da Julia, não dorme antes da vitória final.

Mas ela está certa: somos ruins de país.


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