Folha de S. Paulo


Dar força à Chapecoense

Foi sofrida, pelos livros, a história da queda do avião do Torino, em 1949.

Saber que um timaço desapareceu ao se chocar com o campanário da Basílica de Superga doía no jovem apaixonado por futebol.

Ainda mais porque a Itália, que veio de navio jogar a Copa do Mundo de 1950, no Brasil, seria a favorita para atravessar o Atlântico de volta com a Taça Jules Rimet definitivamente na bagagem, tricampeã mundial em 1934/38/50.

Sem os craques do pentacampeão italiano Torino, a Azzurra acabou por nem passar da primeira fase eliminada pela Suécia que depois viria a ser goleada pela seleção brasileira, imagine, por 7 a 1.

Nove anos depois a tragédia se repetiu com o Manchester United, bicampeão inglês 1956/57, e a Inglaterra penou com as ausências na Copa do Mundo da Suécia, ao empatar três jogos contra Áustria, Brasil e União Soviética, eliminada também na primeira fase.

Na cabeça do jovem as duas tragédias humanas afetavam de tal maneira o futebol que os resultados das duas Copas não podiam ser dissociados delas.

Dois anos antes da Copa na Suécia, no santuário de Wembley, com três jogadores do Manchester United que viriam a morrer em Munique, a Inglaterra vencera o Brasil por 4 a 2, mesmo depois de perder dois pênaltis defendidos por Gylmar dos Santos Neves. Os ingleses fizeram 2 a 0 nos primeiros quatro minutos, se acomodaram, sofreram o empate e depois voltaram a tomar conta do jogo.

Na Copa, o jogo acabou sem gols, verdade que ainda sem Mané Garrincha e Pelé.

Todas essas considerações, lidas e não vividas, para dizer que se havia uma cobertura, em 46 anos de carreira, que temia viver era exatamente a de uma tragédia igual com time brasileiro.

Pois eis que para quem achava que só faltava ver o futebol brasileiro ganhar a medalha de ouro olímpica, o impacto da catástrofe aérea que destruiu a Chapecoense é demolidor neste desgraçado 2016.

Não cabe comparar o time catarinense com o italiano ou com o inglês.

Cabe chorar o infortúnio do Leicester brasileiro que viu seu melhor sonho virar o pior dos pesadelos.

Pensar no treinador Caio Júnior, no goleiro Danilo e no extraordinário Cléber Santana, que na semana passada escolhi para as seleções dos 22 jogadores do Brasileirão, dói.

Como dilacera lembrar do narrador Deva Pascovicci, do comentarista Paulo Júlio Clement, companheiros na rádio CBN, e do introspectivo repórter Victorino Chermont.

Quando o time titular do Torino desapareceu ao faltarem ainda quatro rodadas para o clube ser pentacampeão italiano, e não haver outra solução que não a de escalar a equipe juvenil para terminar o torneio, os adversários também escalaram seus garotos.

Que saída se encontrará no Brasil, mesmo como paliativo para uma dor que não tem consolo?

Será generoso e exemplar da parte dos clubes brasileiros que socorram a Chapecoense com a cessão de jogadores para que possa se recompor. Quem sabe com a supervisão de Tite.

A hora é sim de atitudes simbólicas, de solidariedade.

Mas é muito mais de gestos práticos e eficazes.

De se colocar na situação da Chapecoense, o time que virou de todos nós.


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