Folha de S. Paulo


Autoridades disputam uma triste prova para fazer deficientes

Começa hoje para valer a 15ª Paraolimpíada no Rio de Janeiro, evento que passou a tomar o contorno atual em 1960, em Roma, ainda de maneira incipiente.

Suas últimas versões têm atraído a atenção do mundo inteiro e, se causam aflição em muita gente, revelam até que ponto o corpo humano é capaz de façanhas inimagináveis, desde que cada um esteja disposto a ultrapassar seus limites.

É comum que se fale delas com cuidados desnecessários porque nenhum de seus participantes se coloca como coitado ou digno de pena.

Ao contrário, se divertem e competem atrás das medalhas como quaisquer outros atletas, embora mais que todos devam ser vistos como vencedores.

Sem ironia, ao contrário, com verdadeira tristeza, e indignação, vivemos no Brasil, e especialmente em São Paulo, tempos de uma inclemente corrida sem obstáculos para que as Polícias Militares também excedam todos os limites, mas de violência para reprimir manifestações contra o governo federal.

O dissimulado governador Geraldo Alckmin e seu ex-secretário da Segurança, hoje ministro de botas da Justiça, Alexandre de Moraes, que acaba de implodir a Comissão de Anistia, competem para ver quem destrói primeiro a jovem democracia brasileira.

Estariam concorrendo para ver quem produz mais eventuais atletas para futuras Paraolimpíadas, seja por deficiência visual, seja para amputados?

O que aconteceu em São Paulo no domingo (4) no Largo da Batata é inadmissível, assim como em Belém, no Pará, onde manifestante foi atingido por bala na cabeça.

Não se trata de mera opinião de quem a tudo vê longe do palco onde ocorre a barbárie.

Em São Paulo, vi com os meus olhos ainda intactos uma manifestação pacífica, bem-humorada e até "afetuosa", como classificou o jornalista Eugênio Bucci.

As cenas acontecidas na dispersão do ato paulistano, registradas em filme dantesco dos "Jornalistas Livres", falam por si só.

É tão velha como a ditadura civil-militar de 1964 a prática de policiais provocadores que forjam a baderna para dar vazão aos seus instintos, sedentos por guerrear e ferir quem lhes paga os salários.

Não bastasse a violência da dupla Alckmin/Moraes, há candidatos à prefeitura paulistana que prometem restabelecer os limites de velocidade na cidade, aumentando-os para engrossar as fileiras da delegação paraolímpica brasileira —um quinto dela composta por vítimas do trânsito, como revelou esta Folha na última segunda-feira (5).

Será demais pedir que o espírito paraolímpico os sensibilize para que parem com tais bestialidades?

A democracia brasileira ainda é recente, mas não a ponto de cegar quem vê o tamanho da provocação.

PS: O CoRio-16 e seus patrocinadores deveriam tratar melhor nossa Paraolimpíada, não como evento de segunda classe.

KIRRATA

Novamente, na coluna da segunda-feira (5), em vez de sicrano saiu aqui um ciclano.

O responsável poderia culpar o corretor, pois ciclano existe, embora jamais como substituto de fulano, de beltrano ou de sicrano.

Ciclano é um hidrocarboneto cíclico, seja lá o que isso for.

Já quem o confunde por sicrano é apenas ignorante.


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