Folha de S. Paulo


Algo de podre: futebol masculino do Brasil vive uma nova crise

No aeroporto JK, aguardando o voo para Salvador, o excelente colunista do "Globo" Carlos Eduardo Mansur brincou: "Tive um sonho. O Brasil empatou com o Iraque".

"Nada. Foi um pesadelo", ouviu de volta.

De fato, na noite anterior, a seleção olímpica masculina da CBF havia empatado 0 a 0 com o Iraque, além de ter ouvido o Mané Garrincha gritar o nome do adversário e cantar "olê, olê, olê, olá, Marta, Marta".

Um Rogério Micale de farol baixo apareceu na sala de entrevistas e não escondeu sua tristeza. Resignou-se diante das críticas, repetiu que o mundo do futebol evoluiu e, obrigatório, manifestou confiança de que a classificação virá na Bahia, nesta quarta (10), contra a Dinamarca.

Até errou o cálculo ao dizer que bastaria vencer por 1 a 0 para garantir não só a classificação mas o primeiro lugar no grupo. Não é verdade. A vitória garante a vaga, mas, caso o Iraque vença a África do Sul, será o saldo de gols que decidirá a colocação dos classificados. Isso, porém, é o de menos. Demais é fazer um gol.

Contra o Iraque foram criadas dez chances e nada.

Poderia o treinador sair pela tangente e dizer que sua função é criar condições para o gol ser feito e que ele não joga para botar a bola na rede.

Felizmente não disse e em nenhum momento fugiu de sua responsabilidade, sem as tentativas tão comuns entre nossos técnicos de autoengano, sem culpar o areião de um gramado abaixo da crítica e sem recusar elogios à seleção feminina.

Que virou um parâmetro injusto para fustigar Neymar e companhia, principalmente ao fazer emergir o nome de Marta em Brasília quando ela já estava em Manaus para o jogo desta terça-feira (9) contra a África do Sul.

Marta não gosta de ser comparada a Neymar.

Porque sabe que o futebol entre as mulheres não tem nada a ver com o dos homens e, além de tudo, afinal, ela é que foi eleita cinco vezes a número 1 do mundo, razão mais que suficiente para ser incomparável.

Depois do vexame do 7 a 1 e da eliminação precoce na Copa América, eis que estamos diante do risco de um segundo vexame em megaevento no Brasil.

Se houver a queda ainda na fase de grupos da Olimpíada, só faltará não se classificar para a 21ª Copa do Mundo, na Rússia, façanha inédita a ser debitada na conta da atual gestão na CBF.

O mundo do futebol mudou, o Brasil mudou, a várzea e a praia minguaram como berços de talentos, só a CBF não mudou.

Daí o futebol brasileiro apodrecer lentamente, entre escândalos de corrupção e incompetência, para alegria de quem evoluiu e para escárnio do torcedor.

Apesar de tudo, paradoxo!, impossível não crer na classificação.


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