Folha de S. Paulo


De Brasília vem o caos

O MANÉ GARRINCHA foi palco de dois dos mais recentes e quase únicos conflitos, dentro de estádios, entre torcedores organizados no país. Outro aconteceu em Joinville, em dezembro de 2013.

Em agosto, também de 2013, em Brasília, corintianos tentaram invadir a área de vascaínos se aproveitando do fato de não haver divisórias que os separassem. A polícia precisou usar gás pimenta para separar os brigões das organizadas.

Havia 21 mil torcedores no estádio, entre eles pelo menos três dos que estiverem presos em Oruro, no episódio que matou o menino boliviano Kevin Espada.

No domingo passado, com 54 mil torcedores no superfaturado estádio da Copa do Mundo, outra vez não havia esquema para separar as torcidas organizadas palmeirenses e flamenguistas e outra vez no intervalo os torcedores paulistas partiram para cima dos cariocas e a polícia usou gás pimenta para separá-los.

O resultado é conhecido: quem não tinha nada a ver com o tumulto foi vítima do gás, jogadores vomitavam em campo e crianças eram tiradas passando mal nas arquibancadas, uma delas cadeirante no colo do pai em prantos, imagem que comoveu e revoltou.

Comoveu porque mostrava um pai desesperado de camisa alviverde que beijava o menino aparentemente inerte acompanhados por uma menina de cerca de 7 anos, também com a camisa palmeirense, provavelmente irmã do menino no colo, fugindo dos efeitos do gás.

Revoltou porque mais uma vez a maioria pagou pelos erros da minoria e pelo despreparo policial para tratar o problema.

A barbárie vista no Distrito Federal serve como desonesto argumento para os que defendem torcida única nos estádios, entre estes o ministro interino da Justiça que era o secretário de Segurança em São Paulo quando a medida foi instituída no Estado.

Não foram os torcedores misturados nos mais diversos setores do elefante branco construído na capital federal que causaram confusão.

Ao contrário, deram um lindo colorido rubro-verde-negro ao palco do clássico.

Os que causaram a barbárie, uns uniformizados, outros fardados, nunca são responsabilizados.

A PM porque treinada para lutar, para guerrear, para reprimir, raramente para prevenir, para dissuadir, para organizar.

E a minoria de torcedores organizados que frequentam estádios para brigar porque protegidos pela impunidade há décadas.

Tanto que neste domingo, no Dérbi de torcida única entre Palmeiras e Corinthians, os 21 meliantes que foram presos e imediatamente soltos em Brasília, certamente estarão nas arquibancadas do estádio do mandante, por mais que, como aqueles três de Oruro, sejam conhecidos das autoridades.

Não é justo com Brasília dizer que os males que afligem o país vêm de lá.

Até porque o Brasil ainda não teve um presidente nascido na cidade que um dia foi chamada de Novacap e hoje, se ainda não chega a ser uma Velhacap, já está perto da terceira idade.

Lembremos: tanto o ministro interino da Justiça Alexandre de Moraes como o presidente interino da República são paulistas, e Brasília os abriga porque a circunstância política a obriga.

Só falta eles nacionalizarem a torcida única.


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