Folha de S. Paulo


O que falta é uma ideia

Ganhar ou perder é do jogo. Assim como empatar, enfatizaria o Conselheiro Acácio.

Dunga bateria palmas. "É isso, é isso, enfim alguém me entende!", diria.

Porque Dunga é a obviedade em pessoa, incapaz de uma ideia criativa, de uma surpresa.

No dia seguinte à morte de Cruyff, quando só se falou de futebol total, da beleza do jogo, quando páginas e páginas de jornal, imagens e imagens na TV, homenageavam o pai do que há de melhor no futebol que se joga hoje em dia, eis que Dunga é outra vez o sargentinho (o ão foi o antecessor) que fala as mesmas coisas, se ressente com as queixas de sempre, chove no molhado.

Os times dele, e não é de hoje, podem jogar 20, 30 minutos muito bem e depois outros 50, 60, muito mal.

Tudo parece por acaso, não há uma regularidade, nem muito menos uma filosofia.

Por que raios insiste com o estabanado David Luiz? Quem lhe disse que Filipe Luís é melhor que Marcelo? O que faz Neymar se comportar no Barcelona e viver suspenso na seleção?

As respostas podem ser resumidas numa frase: a CBF tem um técnico medíocre.

Não se diga que a safra de jogadores é tão ruim que em cinco jogos das eliminatórias só deu para ganhar das frágeis equipes da Venezuela e Peru.

Willian, Douglas Costa, Neymar, brilham na Inglaterra, na Alemanha, na Espanha.

Lucas Lima brilha no Brasil, mas Dunga prefere Fernandinho no lugar de Elias.

Imaginar Elias, quando voltar, e Lucas Lima no mesmo meio de campo é proibido pois, no modo dunguista de ser, ambos tratam a bola com mais delicadeza do que ele aprecia e nas eliminatórias "é preciso ser viril, ir no corpo do rival como faz Luis Suárez".

Ah, bem que o coronel Nunes gostaria de ter Dado Cavalcanti, o técnico do Paysandu, "o número 1 do Brasil", segundo ele, à frente da seleção. Mas Marco Polo Del Nero não deixa...

Certas coisas são curiosas.

A Holanda produziu Rinus Michels e Cruyff e os dois juntos, um no banco, o outro no campo, legaram a Laranja Mecânica de 1974.

A Itália tem quase tantos treinadores de excelência como tem jogadores excepcionais.

A Argentina também, assim como a Alemanha.

E o Brasil?

Qual treinador brasileiro, num passado recente contribuiu para realmente inovar, marcar mudanças no jeito de jogar, exportar ideias?

Quem sabe Tite venha a ser este técnico, mas, com certeza, Dunga não será.

Se jogar futebol é simples, mas é complicado ser simples, como ensinou Cruyff, por que Dunga faz do jogar futebol um sofrimento que vive do acaso?

Ganhar, empatar e perder é do jogo, voltamos ao Conselheiro Acácio.

Ser óbvio como Dunga poderia ser uma virtude, como Woody Allen.

Ser uma pilha de nervos no banco pode dar resultado, como prova o argentino Diego Simeone.

Dunga também é e seus resultados são pífios, sem se dizer que o treinador do Atlético de Madri não tem jogadores à altura dos seus rivais espanhóis, ao passo que Dunga tem na América do Sul, argentinos à parte.

Para resumir: a CBF, como a esmagadora maioria dos clubes brasileiros, não escolhe o comandante da seleção por uma ideia de futebol. Escolhe politicamente e para segurar o rojão.

Dá no que dá.


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