Folha de S. Paulo


Saudosa derrota

PERDER PARA a Itália, em 1982, foi doído. "Não se entende mais este mundo. Brasil eliminado", escreveu um jornal andaluz.

Mesmo a derrota para a França, quatro anos depois, na disputa de pênaltis, apesar de o time não jogar nem metade daquele que esteve na Espanha, também foi amarga, dura constatação de que Falcão, Sócrates e Zico jamais seriam campeões mundiais.

Levou algum tempo para que a frase de Fernando Calazans viesse nos consolar: "Zico não foi campeão do mundo? Azar da Copa do Mundo!". Que saudade dessas derrotas, para um timaço como o italiano ou para Platini e companhia!

Até mesmo a decepção de 1998, misturada à perplexidade sobre o que teria acontecido com Ronaldo, teve um quê de dor, porque era uma seleção respeitável a que caiu diante da mesma França.

Assim como há derrotas que dão saudades por remeterem a um futebol apreciável, há vitórias que são comemoradas e ponto.

Ninguém pega o jogo para ver de novo, como a do tetracampeonato, também nos pênaltis, depois de sofridos 120 minutos sem gols sob o sol do meio-dia no Rose Bowl, em Pasadena, subúrbio de Los Angeles, 45ºC à sombra.

É incomparavelmente melhor vencer sem curtir do que perder amaldiçoando a derrota.

Como no sábado, em Concepción, para o Paraguai, que da Itália só tem um "i" e os "as" e da França os "as". Perder jogando bulhufas, recuado para segurar uma vantagem fruto do acaso, dando chutões e ainda tirando de campo o jogador mais tarimbado minutos antes da cobrança dos pênaltis.

Aí dá raiva, dá vergonha e até uma certa esperança masoquista de que –apesar de em regra quanto pior, pior– o vexame leve o Congresso Nacional a fazer virar lei a Medida Provisória do Futebol.

Porque depois de quase um ano do 7 a 1 –derrota que não dá saudade nem raiva, só assombro e boas piadas– não só nada foi feito de aproveitável para mudar como o que foi feito tinha de dar no que deu.

Se Felipão achou um apagão como desculpa, Dunga encontrou a poluição. Enquanto isso, Marin está na prisão, Nero em reclusão, Doria no avião e Feldman, bem, o secretário menor da CBF, esperto como é, deve estar temendo por ter chegado tarde à festa.

Imagine que, a exemplo do que fazia Ricardo Teixeira ao promover campeonatos de favelas, Feldman, herança de seus tempos de PC do B, ficou generoso com Curral das Éguas, em Realengo, onde quer fazer do futebol meio de inclusão.

Como diz Walter de Mattos Jr., uma entidade sem fins lucrativos como a CBF é social por definição. Sua função deveria ser a de desenvolver o futebol. Mas aqui, não no Paraguai. E já, não a prazo de égua.

É essa gente que nos impede, até, de ter saudades de certas derrotas.


Endereço da página:

Links no texto: