Folha de S. Paulo


O que pensa o leitor

A OMBUDSMAN desta FOLHA, Vera Guimarães Martins, contou ontem que não são poucos os leitores que reclamam da cobertura considerada monotemática neste caderno de Esporte.

Caderno cada vez menor, reclama-se, como também registra a fiel e competente defensora do leitor.

Não estou aqui nem para contestá-la, embora pudesse, nem para defender o editor, porque, convenhamos, poderia suscitar dúvidas sobre um dos piores dos defeitos, o puxa-saquismo.

Prefiro lembrar dos tempos em que dirigi a revista "Placar", ainda semanal.

Todas as pesquisas que fazíamos com leitores, ou com não leitores, sobre os esportes que gostariam de ver cobertos, registravam o handebol entre os cinco primeiros, provavelmente porque todos praticaram o esporte na escola. Editasse você uma revista especializada em handebol e, tenha certeza, morreria de fome. Só os jogadores e, talvez, seus parentes a comprariam.

Um belo dia, em 1984, porque "Placar" se aproximava da perigosa marca de menos de 100 mil exemplares semanais, a direção da Editora Abril resolveu que deveríamos transformá-la em "Placar Todos os Esportes", aproveitando a febre do vôlei.

Reunimos o que havia de melhor na imprensa esportiva e não esportiva do país e fizemos uma primeira edição tão bela que recebi de Roberto Civita um bilhete em que ele dizia ter lido pela primeira vez uma edição da "Placar" de cabo a rabo – e olhe que a revista já tinha 14 anos. Elogiava particularmente uma reportagem sobre golfe.

Agradeci o elogio e o informei que, no entanto, e apesar da campanha de lançamento, a edição havia vendido apenas 75 mil exemplares, talvez pela falta de mais futebol.

Recebi de volta outro bilhete que dizia para eu não me preocupar, que estávamos trocando de público e que chegaríamos a uns 35 mil para depois crescer.

Poucas semanas depois,sempre recebendo elogios do dono da empresa a cada revista, escrevi para ele:"Roberto, caro; estamos chegando ao seu objetivo: vendemos 45 mil exemplares!".

Não demorou muito para a revista voltar a cobrir só futebol, porque não havia Joaquim Cruz, Ricardo Prado, Montanaro, Vera Mossa, Oscar e Hortência que vendessem a revista como Sócrates, Zico, Careca, Falcão, Cerezo e companhia, embora já vivêssemos o êxodo de craques para a Europa.

O diagnóstico era certeiro: os antigos leitores ficaram bravos pela perda de espaço do futebol e os interessados nos outros esportes não eram em número suficiente para substituí-los.

Difícil dizer se o Brasil é o país do futebol porque só falamos de futebol ou se só falamos de futebol porque o Brasil é o país do futebol.

E o pior é que nem isso o Brasil é. Se fosse, mais gente iria aos estádios, cobraria os cartolas etc etc etc.

É claro que com a proximidade dos Jogos Olímpicos de 2016, ainda por cima no Brasil, o espaço aos demais esportes deverá aumentar, mas, acredite, se tomar do futebol a chiadeira será maior.


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