Folha de S. Paulo


A paz é possível

A frase da semana é de Hélio Schwartsman, sobre a imoral intenção de se fazer clássicos com torcida única em São Paulo, como já se fez em Belo Horizonte e na Argentina e sem diminuir a violência entre torcidas: "Para constatá-la, basta substituir 'corintianos' por 'judeus' ou 'comunistas'. Não é preciso mais para perceber que é errado vetar a entrada de alguém num espetáculo público em função de suas convicções pessoais".

Eis que na direção oposta do que propôs o MP paulista, as diretorias do Sport e do Inter apresentaram ideias muito mais proveitosas, como as mães de torcedores briguentos fazendo a segurança na Arena Pernambuco ou com um setor do Beira-Rio destinado a misturar colorados e gremistas no próximo Gre-Nal.

Não interessa se são ideias novas ou não. A que envolve as mães, por exemplo, surgiu na "Placar", ainda em 1995, com uma foto de Pelé e dona Celeste: "Se você for homem, leve sua mãe ao estádio", dizia a campanha, que não vingou, da revista.

Já a iniciativa pernambucana deu certo no clássico entre Sport e Náutico, porque até o mais truculento dos valentões se constrangerá em arrumar confusão na frente de sua mãe ou deixá-la em risco numa briga.

Do mesmo modo, não há colorado que não tenha um parente ou amiga gremista e é simplesmente bizarro que não possa ver um Gre-Nal ao lado deles, cada um com sua camisa, o que vale para corintianos e palmeirenses, rubro-negros e vascaínos, atleticanos e cruzeirenses.

Tirante os órfãos de mãe, num ou noutro casos, as medidas atingem a todos.

Além do mais, como diz o autor do relatório da Comissão Paz no Esporte, Marco Aurélio Klein, é "impossível trabalhar quando falamos que determinado jogo vai ter um sistema de segurança rígido, que foi criada uma operação de guerra. A mensagem que estamos dando não é a desejável para o torcedor comum, que pretende ir ao estádio com a família. Temos que ter a percepção do espetáculo e não de uma praça de guerra. As pessoas querem ir naquilo que o futebol é: uma festa, uma alegria. A violência não faz parte do futebol e é preciso trabalhar para que o torcedor possa ter no esporte um momento de alegria e de paixão".

Klein apresentou seu trabalho por mais de duas horas ao ministro do Esporte George Hilton e o impressionou ao mostrar que o controle do hooliganismo na Inglaterra permitiu ao Manchester United ter 96% de taxa de ocupação em seu estádio, o Old Trafford, cerca de 76 mil torcedores em média em quaisquer jogos, seja pela Liga dos Campeões, contra o Bayern de Munique, seja pela Copa da Inglaterra, contra um time da quarta divisão inglesa.

Com inteligência, criatividade e prevenção, a paz é possível também nos estádios brasileiros.

Sem ingenuidade ou mero idealismo, porque também com repressão e punição que afaste, aí sim, a minoria de arruaceiros, cerca de 7% dos "organizados", segundo as sérias pesquisas do sociólogo Maurício Murad.


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