Folha de S. Paulo


Sucessão na PGR e o futuro da Lava Jato

No calendário da Operação Lava Jato, setembro é um mês crucial para a continuidade das investigações. É neste mês que termina o mandato do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, e quando chegará ao ápice uma batalha política pela sucessão. Quem estará no comando deste processo? Os políticos envolvidos investigados pela própria PGR e delatados pela Odebrecht e companhia.

No processo da Lava Jato, na fase de inquérito em que se encontra a "lista do Fachin", a liderança e escolhas do PGR é fundamental. Ocupar esta posição é controlar, no fim das contas, quem pode ser denunciado no Supremo —quais inquéritos gerarão ações penais. O impacto dessas denúncias no curto prazo para o governo, independente do julgamento final, é incalculável. Se Temer mantiver sua promessa de afastar ministros denunciados, o governo pode ver comprometida sua articulação política.

À primeira vista, a sucessão de Janot pode parecer um fato relativamente distante dada a quantidade de informações que espocam a cada dia das investigações e a turbulência no cenário político. Mas a sucessão na PGR é um processo que já está em curso. E os primeiros passos serão dados já nas próximas semanas. Algumas datas são sensíveis.

No dia 10 de maio, a Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR) abre prazo para inscrição na disputa interna por uma vaga na lista tríplice que é enviada à Presidência da República. Os procuradores escolherão os três nomes em junho.

Também em maio, o Conselho Superior do Ministério Público elege dois novos integrantes. E, no dia 17 de agosto, esses dois novos integrantes participarão da eleição dos novos presidente e vice-presidente do Conselho. Estas escolhas podem ser cruciais neste processo.

Dessas datas surgem três indagações sobre a sucessão de Rodrigo Janot.

1 - Temer respeitará a lista tríplice formulada pela ANPR, indicando o mais votado ou ao menos um dos três nomes? A Constituição não o obriga a considerar a lista. Se Temer decidir escolher um nome de fora da lista, terá de arcar com os custos políticos e com as críticas da categoria.

2 - Temer indicará imediatamente o nome do substituto de Janot? Ou seja, escolherá o substituto de Janot já em setembro ou a vaga pode permanecer aberta por alguns meses? Se o presidente não indicar o substituto imediatamente, ocupará interinamente o cargo o vice-presidente do Conselho Superior do Ministério Público, que será eleito em agosto.

3 - E se o vice-presidente do Conselho tiver o perfil que o governo procura para a vaga? Temer poderia indicar o nome para o mandato de dois anos e se ampararia em dois argumentos: a) ao efetivar o procurador interino, evita-se interrupções nos trabalhos da Procuradoria; b) o vice-presidente do Conselho foi eleito para o cargo pela própria categoria. Assim, Temer não indicaria alguém sem respaldo da carreira. Ao contrário, escolheria alguém eleito pela própria categoria.

À frente deste processo estão o presidente Michel Temer, o ministro-chefe da Casa Civil, Eliseu Padilha, o secretário-geral da Presidência, Moreira Franco, o presidente do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE), o presidente da Comissão de Constituição e Justiça, senador Edison Lobão (PMDB-MA), o líder do PMDB, Renan Calheiros (PMDB-AL), o líder do governo, Romero Jucá (PMDB-RR). Todos são citados nas delações da
Odebrecht. E somente Temer não é alvo de inquéritos.

No Senado, onde o candidato a PGR será sabatinado, 24 parlamentares foram citados nas delações de executivos da empreiteira Odebrecht e responderão a inquéritos. Outros quatro já eram alvos na Lava Jato, mencionados em outras delações e investigações.

E como a escolha do novo procurador pode mudar os rumos das investigações?

1 - O novo procurador pode dissolver o grupo de trabalho que foi montado em Brasília por Janot. São esses oito procuradores de diferentes estados que tocam diuturnamente as centenas de inquéritos, depoimentos e delações premiadas da Lava Jato.

2 - Com a desconstituição do grupo que atua hoje em Brasília, boa parte da memória do caso teria de ser recuperada pela próxima gestão. E essa nova equipe teria de começar praticamente do zero a análise das centenas de milhares de páginas da investigação.

3 - O substituto de Janot pode adotar uma postura mais concentradora, trazendo para si o passo-a-passo da investigação. Como se trata de um processo extenso - já estão em andamento no Supremo 113 inquéritos e 5 ações penais -, o procurador não teria condições de dar celeridade ao caso.

4 - O novo procurador pode, inclusive, desconstituir a Força Tarefa da Lava Jato em Curitiba.
Esses são apenas três exemplos de como a investigação pode, no mínimo, perder ritmo em razão da troca de comando na PGR. Sem contar com a possibilidade - considerada remota por integrantes do Ministério Público neste momento - de ser escolhido uma espécie de engavetador-geral da República, um procurador com visão mais conservadora ou mais condescendente com a política.

O cenário menos turbulento para as investigações seria a permanência de Janot para o terceiro mandato. A recondução é legalmente possível, mas improvável. O procurador já deu provas de que não quer permanecer no cargo por mais dois anos. Prova disso foram as longas férias que já agendou para depois de setembro.

A soma de todos esses fatores cercará o processo de sucessão na PGR. Políticos investigados, com poder de voto ou de caneta, deverão pensar na própria sobrevivência na escolha do perfil para comandar o Ministério Público Federal. O anseio da sociedade por aprofundamento das investigações e celeridade dos processos estará em segundo plano.


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