Folha de S. Paulo


O metro quadrado e as políticas urbanas

O preço do metro quadrado dos terrenos em São Paulo e no Rio está asfixiando as cidades. O problema atravessou o mar e desfilou na passarela do Prêmio Nobel.

Robert Shiller, que acaba de ganhar o Nobel de Economia, em agosto deste ano, avisou que algo estava errado. Os preços dos imóveis em São Paulo e no Rio dobraram em cinco anos (2008-2013). Até ele, numa escrivaninha de Yale, percebeu.

Deu em "O Globo": A Fipe registra aumento de 227,5% nos imóveis residenciais, no Rio, e 184,7% nos de São Paulo desde janeiro de 2008.

A política habitacional é fortemente afetada. Com o déficit de moradia alcançando cerca de seis milhões de habitações concentradas nas regiões metropolitanas, a valorização do metro quadrado só tende a piorar a situação.

"As pessoas vão continuar optando pelas melhores áreas. Acontecendo um efeito cascata com as demais regiões na valorização de preços", adverte o presidente do Secovi-Rio. Acaba tudo mais caro.

Local/Região 2009* 2013*
Jardim Europa R$ 3.219 R$ 7.713
Capão Redondo R$ 56 R$ 131
Vila Andrade R$ 592 R$ 1.398
Vila Mazzei R$ 438 R$ 1.033
Jardim Europa R$ 1.715 R$ 4.047
Jardim Paulistano R$ 3.411 R$ 8.030
Higienópolis R$ 2.264 R$ 5.329
Paulista R$ 9.285 R$ 21.788
Vila Mascote R$ 537 R$ 1.257
Penha R$ 267 R$ 626
Anália Franco R$ 826 R$ 1.934
Cerqueira César R$ 2.724 R$ 6.370
Águas Espraiadas R$ 781 R$ 1.826
Campo Belo R$ 926 R$ 2.162
Butantã R$ 420 R$ 977
Perdizes R$ 853 R$ 1.986
Vila Leopoldina R$ 749 R$ 1.735
Paraíso R$ 2.177 R$ 5.043
São Miguel Paulista R$ 138 R$ 319
Berrini R$ 2.966 R$ 6.842
Shopping Tucuruvi R$ 281 R$ 643
Parque do Carmo R$ 123 R$ 282
Cracolândia R$ 945 R$ 2.152
Monotrilho Leste R$ 315 R$ 716
Itaquera R$ 141 R$ 321
Augusta R$ 1.557 R$ 3.485
Alto de Pinheiros R$ 898 R$ 1.999
Faria Lima R$ 5.375 R$ 11.865
Anália Franco R$ 552 R$ 1.209
Jardim Pantanal R$ 123 R$ 260

Mas não é só a política habitacional que entra no imbróglio. Cada vez, tornam-se mais difíceis áreas públicas para esporte, lazer e estacionamento.

Os estacionamentos, já escassos, vão ficar mais caros. E não haver estacionamentos fora das vias públicas significa ocupá-las com carros parados, diminuindo-se a fluidez, piorando o trânsito.

As prefeituras de São Paulo e do Rio precisam de um estoque de terras para acomodarem as populações que vivem em áreas de risco ou em condições precárias. Em São Paulo, quando favelas pegaram fogo, não havia locais para isso, criando-se uma situação de desespero.

Quando se quer retirar cidadãos de algum lugar, a primeira pergunta a fazer é: "Para onde eles vão?" Não é possível deixar pessoas ao relento.

Somando os habitantes em áreas de risco, em condições precárias, e os que vivem em loteamentos irregulares, atinge-se mais de dois milhões. Problema imenso, que tem ficado embaixo do tapete e que só se resolve com a interferência vigorosa do poder público.

O mercado não vai resolver isso. A lógica do mercado imobiliário só irá agravá-lo.

A prefeitura precisa reservar áreas para parques, praças e equipamentos esportivos. A cada conjunto de quarteirões, há necessidade de uma praça para as pessoas respirarem, contemplarem e levarem as crianças. Há muito tempo que uma das maiores reivindicações das mães de periferia é terem uma pracinha para os filhos que vivem apertados em cômodos acanhados.

Com o crescimento vegetativo, com a dificuldade de as cidades se estenderem, com a concentração de empregos, os espaços vão sendo ocupados de forma inadequada.

Danilo Verpa - 18.abr.13/Folhapress
Espaço que poderia ser melhor aproveitado pelas prefeituras
Espaço que poderia ser melhor aproveitado pelas prefeituras

Some o espaço público vital para o direito a usufruir a cidade que temos.

Robert Shiller ganhou o Prêmio Nobel pelos estudos que fez sobre o preço dos ativos (títulos e ações). Vislumbrou um comportamento irracional nos agentes econômicos.

Surgem problemas graves, quando há excessos não regulados de forma correta.

Nas cidades, também estamos nos comportando irracionalmente. Penalizando a nós mesmos.

É crucial que o poder público regule o uso e a ocupação do solo, olhando para as necessidades das pessoas. A cidade é para elas viverem bem; não de favor, incomodadas ou angustiadas.

Na hora de se consolidar o Plano Diretor, é preciso que o todo esteja em mente. Criar leis isoladas, com base em coisas ou apenas em posturas e códigos de obras, conduz a cidade a um beco sem saída.

A preservação de um espaço vital para convivência e prazer exige disciplinar o valor do solo.

O direito à cidade não tem preço.


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