Folha de S. Paulo


Comê-los-ei

SÃO PAULO - Michel Temer usa uma mesóclise para dizer que irá consertar os erros de seu governo, "quase solenemente", para que sociedade e Congresso entendam que o momento é grave. E troca a norma culta por um tapa na mesa para lembrar que já foi secretário de Segurança Pública em São Paulo, "tratava com bandidos", sabe o que fazer.

Extremos do governo interino se evidenciam nas duas passagens. De um lado, Temer é o moderador que irá trabalhar para que Legislativo e Executivo tirem o país do atoleiro. É o presidente que entregou seu futuro nas mãos de Henrique Meirelles e emplacou a revisão da meta fiscal em seu primeiro grande teste no Congresso na última madrugada. Mercado e gente comum, que não consegue fechar as contas no final do mês, torcem desesperadamente por ele.

Do outro, Temer é o presidente que ainda depende de uma maioria de dois terços no Senado para se manter no cargo, congrega ao seu redor alvos da Lava Jato e atura com dificuldade um sem número de manifestações. Apoiadores profissionais mas também a nova oposição torcem para que esse Temer, o político tradicional, prevaleça. Ele é a esperança de uma mudança legal (ou não) no ritmo da Lava Jato e um adversário bem mais fácil de malhar nas ruas.

Temer, pelo menos neste começo, vem se esforçando em conciliar esses seus extremos. Corrigiu equívocos de ministros, voltou atrás no rebaixamento da Cultura e se livrou rapidamente de Romero Jucá. Decorou a cartilha de Meirelles e não esconde a disposição de aumentar o espaço no governo de seu artilheiro. Empurra a discussão da Previdência para a frente, encara sereno as reações ao teto de gastos públicos.

A ver se terá estômago para engolir outros tantos sapos. Não bastassem os vizinhos de ocasião em Alto de Pinheiros, tudo indica que as demonstrações de política explícita que surgem dos grampos de Sérgio Machado produzirão uma enorme quantidade deles.


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