Folha de S. Paulo


A revolta antipolítica

O mundo está cansado da política tradicional, descolada dos anseios de parcelas relevantes da população. O "brexit" na Inglaterra, a candidatura de Trump nos EUA, a derrota do plano de paz colombiano; em todos os casos, a opção popular foi contrária ao discurso das elites políticas, culturais e midiáticas que acreditavam dar as cartas do jogo.

O Brasil também expressa o sentimento antipolítico, mas sem discursos radicais. O que temos é, de um lado, o aumento da indiferença e, de outro, o sucesso de candidatos não políticos. São Paulo elegeu em primeiro turno o empresário João Doria, que teve, mesmo assim, menos votos do que o total de brancos, nulos e abstenções.

Uma ideia para reduzir a distância entre política e eleitorado é uma reforma política. De maneira geral, quando não é para defender interesses da classe política já instalada, essa via advoga mais democracia direta e comitês populares, como proposto por Marcelo Freixo (PSOL) no Rio. Para o cansaço da política, pregam a intensificação dela. Será uma boa ideia?

Política democrática é como reunião de condomínio. Para algumas questões ligadas ao que é comum, reuniões dos moradores são importantes. Melhor escolher o síndico do que ter um imposto contra nossa vontade.

Dito isso, para a maior parte das questões, o melhor é justamente não depender da assembleia. Ela demanda um tempo e um conhecimento que não temos e promove conflito e desunião entre as pessoas, como é da natureza de qualquer processo no qual grupos disputem o poder e no qual o projeto vencedor é imposto mesmo aos perdedores. A cor da sua sala, o vidro da sua janela, seu consumo de água; quanto menos dessas questões tiverem que passar pelo voto da assembleia ou pela caneta do síndico, melhor.

O mesmo vale para a política de uma cidade ou país. Será desejável aumentar o tempo que dedicamos a problemas dos quais pouco entendemos (política energética, transportes, etc.) e que nos levam a brigar com quem discorda? Aumentar o espaço das nossas vidas que é tomado pela deliberação coletiva significa, no limite, transformar a vida em sociedade em uma interminável reunião de condomínio.

A outra saída, liberal, propõe a limitação do papel da política em nossas vidas. A rejeição da política é a reação saudável de quem percebeu as limitações dessa via para resolver seus problemas. Os grandes sonhos políticos estão em baixa, e o governo é chamado a ser algo mais modesto: um prestador de serviços eficiente. Com um Estado que, somando impostos e déficit, gasta mais ou menos de 40% do PIB e entrega os serviços que conhecemos, será um longo caminho.

Para que a eficiência se torne meta central, muito terá que mudar. Saem programas de governo grandiosos, entram métricas de custo-benefício implacáveis para direcionar nossos recursos onde eles realmente geram impacto. Sai a lógica de dar tudo a todos, entra o foco apenas em ajudar quem realmente precisa e instituir regras simples que promovam a criação de valor.

Um Estado eficiente e limitado, que deixa mais espaço para a criação de valor, a espontaneidade empreendedora e para as relações humanas harmônicas. Aí está um ideal que, felizmente, reduz a politização de nossas vidas. E que, no entanto, exigirá, para ser implementado, um enorme esforço de politização.


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