Folha de S. Paulo


A ditadura dos partidos

Lula Marques - 15.abr.2006/Folhapress
Fim do recesso parlamentar já começa a dominar atenção de investidores
Vista externa do Congresso Nacional, que retorna do recesso nesta segunda (31)

O Congresso volta do recesso esta semana e uma das principais matérias em pauta será a reforma política. A "reforma" não procura melhorar a representatividade do cidadão ou aproximá-lo da política. Ela tem como principal objetivo perpetuar no poder os atuais congressistas. A prioridade é a aprovação de um fundo com dinheiro público para campanhas políticas.

Sem a possibilidade de receber recursos de pessoas jurídicas, de regularizar dinheiro de propinas através da doação de empresas, e sem credibilidade para arrecadar dinheiro de pessoas físicas, os partidos estariam forçados a fazer campanhas austeras em 2018.

Este quadro deixou a classe política extremamente apreensiva. Como permanecer no poder, mantendo todos os benefícios e o foro privilegiado, em um ambiente onde o eleitorado está ávido por renovação?

A solução encontrada foi a de sempre: retirar dinheiro do nosso bolso e limitar a nossa liberdade. Assim, está sendo proposta a criação do FFD (Fundo Especial para o Financiamento da Democracia), e a limitação expressiva de doação de recursos de pessoas físicas para campanhas de terceiros ou para a sua própria.

O FFD seria equivalente a 0,5% da receita líquida do governo e distribuído da seguinte forma: 2% divididos entre os 35 partidos existentes e 98% de acordo com a bancada atual de cada agremiação.

Quais as consequências da aprovação desta proposta:

  • A alternância de poder, através de novas agremiações ou lideranças, fica praticamente extinta. Dado o tamanho do fundo, as regras de sua distribuição e as restrições criadas para doações voluntárias ingressaremos, definitivamente, na era da ditadura dos atuais partidos e dos seus caciques.
  • A corrupção será premiada. Os 4 partidos mais envolvidos em denúncias —PMDB, PT, PSDB e PP— receberão R$ 1,5 bilhão ou 43% do FFD.
  • Consolida-se a impressão de que, no Brasil, o crime compensa.Os partidos que elegeram bancadas, mesmo com propinas, com tesoureiros presos ou presidentes investigados, farão jus a mais dinheiro público. Depois no poder —com foro privilegiado, morosidade da Justiça e mudança de regras— encontram uma forma de evitar qualquer investigação.
  • Haverá interesse por parte dos políticos para o aumento dos impostos. O montante do Fundo é definido como um percentual da receita líquida (volume de impostos cobrados menos as transferências para estados e municípios), sempre que ocorrer um incremento da carga tributária haverá uma elevação da verba para os partidos políticos, mesmo que a gestão pública seja sofrível e apresente um déficit elevado, como acontece hoje.

Em um período de grave crise fiscal é um absurdo que nenhum partido, com exceção do Partido Novo, tenha se manifestado contra a criação do fundo. Fica claro, mais uma vez, que representar o cidadão e defender os seus interesses não é uma prioridade para os principais partidos hoje existentes.

Em 2018 teremos uma eleição polarizada: de um lado os que julgam que a população brasileira é desinformada, ignorante e sem memória e do outro os que acreditam que os brasileiros apreenderam com a crise, entendem a importância da política e serão conscientes nas suas escolhas.


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