Folha de S. Paulo


Conceito de novo de Armínio Fraga é o velho após uma plástica

Ricardo Borges/Folhapress
Rio de Janeiro, Rj, BRASIL. 02/08/2017; Fotos de Arminio Fraga em seu escritorio no Rio. ( Foto: Ricardo Borges/Folhapress)
Armínio Fraga, ex-presidente do Banco Central, em seu escritório no Rio de Janeiro

Ao vetar investigações sobre o denunciado Michel Temer, a Câmara consagrou o direito de ser corrupto por estar no poder. Desde então, em entrevistas e em artigos de não jornalistas, sucedem-se preocupações urgentes com o conserto e o futuro do país, como se a decisão dos deputados fizesse soar o alarme. O professor Oscar Vilhena Vieira, por exemplo, em sua coluna na Folha alinhou e fundamentou, com precisão, quatro providências essenciais para melhoria da representação política no Congresso e nos Estados. O ministro Luis Roberto Barroso, sem sequer arranhar os limites de magistrado, aumentou a luminosidade e a ação do seu holofote crítico. E assim vários outros.

Dois deles prestam-se em alto nível a uma comparação que ilustra parte dos fatores –nas últimas décadas talvez a parte principal– da incapacidade brasileira de desligar-se do atraso e construir uma nação. Um é Armínio Fraga, destaque no mundo do dinheiro, especialista nos canais de produção dos lucros montanhosos sem as batalhas de produção e comércio, presidente do Banco Central no governo Fernando Henrique. O outro é Benjamin Steinbruch, industrial não paulista, presidente da Companhia Siderúrgica Nacional, um dos beneficiários da privatização, por valores degradados, dessa empresa e da Vale no governo Fernando Henrique.

Por coincidência não planejada, os dois estavam na Folha da última terça, 8. Fraga dispôs de página inteira e de 14 perguntas estimulantes, de Ana Estela de Sousa Pinto e Ricardo Balthazar. Não era preciso mais, mas não foi suficiente para obter-lhe alguma ideia nova. Ou uma ideia, simplesmente. Curioso é que seu tão repetido ataque ao "Brasil velho", uma expressão vaga e usada vagamente, é a que melhor serve para caracterizar o que diz e, presume-se, o que pensa: Lula e o PT não podem voltar ao governo; o "ajuste" deve ser "bem feito e radical" porque "provavelmente aumentaria nossa capacidade de crescer", e tome mais e mais diretas e indiretas contra a fantasmagórica volta de Lula.

Dilma? "Com certeza a saída dela ajudou muito". Mas a quem e a quê? Entende-se que Fraga pare a frase naquele ponto: embora não por modéstia. Sugestões para o crescimento, contra o desemprego, os problemas sociais, saídas da crise, remodelação política –nada. Enfim, o novo de Armínio Fraga é o velho depois de uma plástica, como Moreira Franco.

Steinbruch ficou no tamanho de sua coluna quinzenal. "É preciso expor alguns números que mostram a gravidade da situação dos brasileiros". E tome de Brasil: 13,5 milhões de desempregados é "número subestimado". Entre 14 e 24 anos de idade, desemprego perto de 30%. No fim do ano, "segundo o Banco Mundial, cerca de 40 milhões de brasileiros em condição de pobreza", com "renda de até R$ 140 por mês" (menos de R$ 5 por dia). Na classe média, "57% das família estão endividadas". Seguem-se a crítica às medidas de "estratégia defensiva", à educação e saúde que "pioraram assustadoramente" e à política "equivocada e omissa" dos juros.

São várias as medidas necessárias "para recolocar o país em crescimento". Uma delas, uma das fundamentais é nada menos do que "extirpar o rentismo que domina o cenário há décadas", o rentismo (de renda) que multiplica riquezas, não com trabalho e produção, mas com juros e Bolsa. Sugestão brava do industrial.

Armínio Fraga e Benjamin Steinbruch são linhas paralelas. A do primeiro predomina na influência sobre os poderes, porque adotada pelo empresariado militante e rico de São Paulo. Inclusive industriais, mais apegados aos lucros do rentismo do que a investimentos nas suas empresas. A linha de Steinbruch, a dos empresários que, nas crises econômicas como a atual, trabalham para não quebrar. Ou para não entregar sua empresa a empresários estrangeiros, o que hoje é comum.

Dessa divisão, com um lado predominante sobre o poder, nasce grande parte do que se chama, sem que sejam, "política brasileira" e "governo brasileiro".


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