Folha de S. Paulo


A derrota

As derrotas de Eduardo Cunha em propostas muito desejadas por ele na fracassada reforma política, embora chamem mais atenção, não o tornam o maior perdedor nessas surpreendentes votações da Câmara. O maior derrotado não votou, não estava lá, nem tinha por que estar –ainda que sua arma devesse ser também e sempre o voto.

O maior derrotado nas derrotas da reforma é o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal.

Uma só das propostas ligou Gilmar Mendes às pretendidas mudanças na legislação política. Mas foi a mais importante: o financiamento das campanhas eleitorais. Origem e campo da mais grosseira e constante corrupção que deteriora a administração pública e arruína toda a vida política.

No julgamento do Supremo entre a extinção e a permanência desse financiamento eleitoral por empresas, já com a extinção apoiada pela maioria (6 votos a 1, faltando 3), Gilmar Mendes paralisou a votação, com um pedido de vista do processo. Já o retém há um ano e um mês. A retenção correspondeu à espera da iniciativa prevista no Congresso para confirmar a continuidade da ligação direta entre dinheiro de empresas e eleições.

Favorável, claro, ao financiamento empresarial, Eduardo Cunha providenciou a ação no Congresso. Com esperta proposta incluída no projeto de reforma política por ele decidido e conduzido até o penúltimo passo. Era uma emenda que incluiria na Constituição o financiamento empresarial, assim prevenindo -o da proibição pelo Supremo ou por alteração da lei eleitoral. Contra a expectativa generalizada, a emenda foi derrubada pela maioria da Câmara, já madrugada de ontem.

De abril do ano passado para cá, Gilmar Mendes expôs de público, numerosas vezes, sua defesa da participação financeira das empresas nas eleições. Tornava ostensivo que não impedia a conclusão do julgamento no Supremo para exame do processo.

Em termos morais, éticos, jurídicos e institucionais, Gilmar Mendes apostou muito alto no financiamento empresarial, muito mais do que o outro grande derrotado Eduardo Cunha. A derrota foi maior, e com mais sentidos.

O julgamento do Supremo deverá ser retomado. Não se sabe quando, nem se por iniciativa de Gilmar Mendes, se por aplicação do poder/dever do presidente do Supremo de agendar, para votação, processos retidos por tempo contrário às normas do tribunal. O simples reinício selará o fim da sociedade de urnas e cofres empresariais.

SERVIÇO GARANTIDO

Tínhamos que passar o vexame de serem polícias estrangeiras a levar para a cadeia um ex-presidente da CBF, dos três possíveis.

Desde seu distante tempo de CBD, a CBF goza no Brasil de um habeas corpus incassável e não concedido. As suspeitas suscitadas pelas administrações de João Havelange e Ricardo Teixeira, com extensão aos próprios, tiveram sempre a protegê-las o argumento de que, sendo privada e não pública, a entidade não está sujeita a investigações da Polícia Federal. E menos ainda a intervenção.

As contestações ao argumento jamais encontraram espaço e tempo bastantes para prosperar. Na verdade, não foram muitas. As ramificações sociais e políticas de Havelange e Teixeira, sempre lubrificadas pela CBD e depois CBF, prestavam serviço completo.

A Costa Rica instaurou inquéritos ontem mesmo contra sua a entidade do futebol e contra o dirigente preso na Suíça.


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