Folha de S. Paulo


Palavra de ministros

Aos olhares simplificadores, as atitudes da ex-ministra Marta Suplicy e do Gilberto Carvalho pareceram críticas de igual intenção. E até de igual importância. Muitos precisam alegrar-se com o que apareça, para reconstruir-se depois de lançarem a desconstrução como programa eleitoral. E ruírem.

Se alguém esperasse que Marta Suplicy se demitisse com uma carta de agradecimento pela oportunidade recebida, poderia supor também algum significado maior na carta pontiaguda que cravou na presidente e, claro, divulgou na internet. Mas Marta Suplicy foi só a Marta Suplicy.

Gilberto Carvalho também foi Gilberto Carvalho. Calmo, delicado, com a franqueza de sempre, disse verdades sobre o governo, sobre a Presidência de que é o secretário-geral e sobre Dilma Rousseff. Suas constatações resultam em críticas que são inquestionáveis no fundamento e não ficam nas estreitezas temáticas dos economistas e dos jornalistas.

Dilma Rousseff não lidou bem com os políticos, de fato, em seu primeiro mandato. A par da maneira de ser, e de ter com políticos uma experiência sobretudo de convívio entre companheiros, Dilma sucedeu o traquejo e flexibilidade de Lula. Contraste estiolante. O mesmo em relação ao que Gilberto Carvalho chamou de "movimentos sociais", em cujas "demandas [Dilma] avançou pouco". Nesse quesito, Dilma e o governo apegaram-se a poucas diretrizes, com realce para a distribuição de renda pelos salários e a saúde pelo Mais Médicos. O demais ficou por conta dos seus responsáveis, com resultados variáveis.

O apoio para tornar os assentamentos produtivos pode ter aumentado, mas a reforma agrária como um todo "não foi o que os movimentos esperavam". Muito longe disso. E mais longe ainda, sem possibilidade de ressalva alguma, foi o descaso com a demarcação de terras indígenas e com a proteção devida às aldeias sob o tiro de tomadores de terras, quando não caem por fome e doença mortíferas.

O crescimento da "resistência ideológica e econômica fortíssima à questão indígena" leva Gilberto Carvalho a uma conclusão mais ampla, como causa: "A direita cresce porque cresce". Mas a verdade é pior. No problema dos indígenas, a ação "da direita" cresceu porque o governo lhe cedeu espaço e força. E é duvidoso que busque recuperá-los.

Gilberto Carvalho acentua a deficiência, com resultados graves, "de diálogo com os principais atores na economia", por falta de "competência e clareza" do governo. Sem dúvida. Nesse caso, ainda que mantido o diagnóstico do ministro, a responsabilidade deve ser compartilhada pelos dois lados. Os "principais atores na economia" investiram muito na pressão e na chantagem. No país em que ter dinheiro é tudo, os portadores deste justificado sentimento, ainda por cima, chegaram a Dilma viciados por 16 anos de Fernando Henrique e Lula e respectivas curvaturas.

Nesse capítulo, cabe um acréscimo à deficiência de diálogo citada pelo ministro: a deficiência de comunicação com o país foi imensa. Dilma e o governo pagaram, pagam e pagarão muito por isso. E o país também.

A propósito, Gilberto Carvallho fez, à margem do seu tema, uma afirmação também útil, quando indagado se continuaria ministro: "Qualquer ministro que falar qualquer coisa [sobre o novo ministério] estará falando bobagem". Imagina os jornalistas.

OPERAÇÕES

A Polícia Federal "nega veemente que houvesse agido de forma parcial em investigação sobre dinheiro apreendido com três passageiros" no aeroporto de Brasília, assunto de artigo aqui há quatro dias. A PF afirma haver recebido informações, a respeito, "de fontes diversas, uma delas do Ministério Público Federal". Nega também haver fornecido a foto do embarque publicada "com exclusividade pela própria Folha de S.Paulo".

A foto de autoria misteriosa não foi exclusiva da Folha. Ocupou farto espaço, sem autoria definida, na primeira página do "Globo" de 9 de outubro. Está aceita a negativa da PF, mas não era esperável que confirmasse motivações estranhas em sua conduta durante o segundo turno. Note-se, aliás, que condutas similares a PF teve também no Ceará, quando submeteu familiares do candidato Eunício Oliveira a investigação constrangedora e frustrada; e no Maranhão, quando fez o mesmo com o candidato Lobão Filho, familiares seus e no avião em que viajavam. Com fotos.

Em tempo: a citação ao Ministério Público Federal também não surpreende.


Endereço da página: